Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Carta aberta ao presidente do IST & loucura universitária na UL

TMC, 10.10.11

O Tiago Veras escreveu um texto ao presidente do Instituto Superior Técnico onde fundamenta e justifica a implementação de um sistema de estacionamento pago para o campus do Instituto. Com a devida autorização, publicamo-la aqui.

 

Nota: até à data não houve qualquer resposta.

 

Caro Prof. António Cruz Serra,

 

No seguimento da mensagem ‘Nota Informativa CG/33/2011 - Restrições orçamentais em 2012’, e no sentido de colaborar para a sustentabilidade financeira do nosso Instituto, sugiro que todo o estacionamento no interior do campus Alameda seja cobrado, à maneira do que é feito no estacionamento na via pública na envolvente deste campus.

 

Apresento de seguida um pequeno exercício de cálculo, para que se perceba melhor o potencial desta proposta.

 

Sublinho que o valor das receitas anuais corresponde à metade do esforço financeiro a ser empreendido pela nossa instituição.  

 

Esta medida, ainda, teria custos de implantação nulos ou insignificantes, pois o acesso existente, através de cartão, identifica já o utilizador e os horários de entrada e saída. Bastaria, através de um programa informático simples, associar os cartões à respectiva despesa em estacionamento, podendo a cobrança ser feita, por exemplo, através de débito automático no vencimento (no caso dos professores).

 

Compreende-se que há direitos adquiridos, relativamente ao estacionamento neste campus, que seria difícil enfrentar. Entretanto, face ao esforço que será exigido a todos os utilizadores deste campus, penso que vale a pena considerar esta medida, mesmo que se tenha em conta, para cada quarto de hora ‘estacionado’, um valor mais baixo que o considerado neste exercício. A renúncia a serviços eventualmente mais indispensáveis, como a segurança e a limpeza, teria portanto uma menor expressão para todos os professores, alunos e funcionários do IST.   

 

Com os melhores cumprimentos,

Tiago Veras

 


Quem duvidasse da força com que o automóvel está entranhado na psicologia de deslocações urbanas dos portugueses, é só ler esta notícia: cinco associações de estudantes e alunos convidam à rejeição do sistema de estacionamento pago anunciado pela UL. A radicalização (por vezes com promessas de violência física para com os parquímetros) das posições face ao que é falsamente percepcionado como um direito adquirido (o estacionamento gratuito) apenas demonstra a patologia que é acreditar que a cidade tem de albergar de qualquer maneira os automóveis e que estes são inócuos.

 

Façamos o seguinte exercício: se considerarmos que alguém só a assina uma petição se esta for contra o que é percepcionado como um estado justo de coisas (neste caso, estacionamento gratuito na alameda da UL), quando foi a última vez que pelo menos cinco associações de estudantes promoveram tão rapidamente uma petição para se pugnarem por um tal estado justo de coisas ? Não haverá causas sociais e potenciais alterações legais que merecem uma mobilização tão frequente e tão activa como esta? Haver há, mas não cativam nem invocam esta fúria e esta mobilização.

 

A conclusão é que a percepção dos direitos da entidade "condutor + carro" é mais cara ao condutor do que qualquer outra. E isso é perigoso.

 

 

Fim da aberração na Universidade de Lisboa

TMC, 08.10.11

O estacionamento gratuito na Alameda da Cidade Universitária acabou. A EMEL vai passar a geri-lo. Para lidar com tamnha perda, a empresa vai promover uma campanha de sensibilização dos condutores. Num comunicado, a UL anuncia:

 

Já a partir de dia 10 de Outubro, os 485 lugares de estacionamento na via pública da zona da Cidade Universitária vão passar a ser geridos pela EMEL, como resposta à necessidade sentida de melhor ordenar o estacionamento e mobilidade nesta zona central da cidade.
 
A partir de Novembro a EMEL vai, ainda, gerir um parque de estacionamento na zona da Cidade Universitária com 600 lugares, intervindo para  a melhoria e modernização da gestão deste parque.
 
Com o estacionamento mais ordenado na Cidade Universitária conseguimos contribuir para o arranjo e ordenamento do Campus, sendo esta, uma das medidas que consta do Plano Estratégico da Universidade de Lisboa 2009/2013.

 

Já neste texto abordei esta problemática: os campus universitários, face à enorme afluência dos seus funcionários, docentes e alunos geram quantidades significativas de tráfego automóvel, pelo que este deve ser evitado; a política de gestão do estacionamento destes campi deve fazer com que o acesso ao campus seja feito através de transportes públicos ou de bicicleta, já que estes se concentram no miolo da cidade, estando por isso servidos de bons acessos.

 

Na altura, e com o auxílio de mais interessados, criámos também um blogue com as críticas ao estacionamento no campus do IST e uma sugestão (da autoria de Tiago Veras) daquilo em que se poderia tornar uma morada mais agradável e mais humanizada caso não fosse concedido acesso quase gratuito aos automóveis; no minímo, defendia-se, igualar as tarifas dentro do campus com aquelas do exterior, evitando que o IST fosse um autêntico paraíso do estacionamento mesmo no centro da cidade.

 

Coincidência ou não, também ontem a UL, noutro comunicado, anunciou que tinha logrado angariar votos suficientes para o seu projecto 172 do Orçamento Participativo da CML; o objectivo é a requalificação da própria Alameda da Cidade Universitária. Parece-me óbvio que este objectivo de requalificação está relacionado com o fim do estacionamento gratuito.

 

Este blogue fez sugestões neste sentido há quase dois anos. Dois dos autores da proposta de requalificaçaõ do IST nem tinham acabado a sua licenciatura. E outros especialistas já terão feito propostas neste sentido há mais tempo. Qual é a surpresa?

 

 

 

Dois países

TMC, 31.10.10

O caderno "Cidades" do Público traz hoje uma série de artigos sobre a realidade da mobilidade no interior do país. Neste blogue abordamos com mais frequência as desvantagens da utilização massiva do automóvel em meio urbano e a série de políticas públicas que seguiram o seu paradigma, redundando na proliferação das auto-estradas e redução dos serviços prestados pelo transporte ferroviário.

 

O princípio chave que sustenta todas as sucessivas críticas é que o direito à mobilidade, consagrado na constituição portuguesa, seguiu a equivalência de um automóvel por cidadão; o pensamento é o seguinte: com um automóvel poderemos chegar a qualquer lado, desde que haja estradas e estacionamento. Ora, é uma solução redutora: além dos defeitos para que temos apontado de modo sistemático, esta solução pressupõe que todos os portugueses têm capacidade para o fazer (com ou sem recurso ao crédito) e que o devem fazer.

 

O automóvel é uma boa solução enquanto existirem certas condições que o satisfaçam: estradas, viagens semanais frequentes, estacionamento farto ou fiscalização reduzida e inexistência de impostos que internalizem todos os custos envolvidos no seu fabrico e uso generalizado. Se as últimas condições são políticas e financeiras, as primeiras coincidem com o ordenamento do território de meio urbano. Em meio rural, um automóvel como solução universal de mobilidade não pode vingar porque a sua compra não seria justificável, e assim o direito à mobilidade raramente é assegurado, pois qualquer rede de transportes públicos implica custos adicionais; carreiras vazias e com baixa frequência, já que as aldeias estão dispersas, fragmentadas, longes da capital de distrito onde existem os serviços de farmácias, as escolas, os hospitais. Nem falemos da cultura.

 

O que os artigos demonstram é precisamente a existência de dois países e de um paradoxo: o que pensamos ser um enorme problema no país de meio urbano dado o excesso de automóveis ou, posto por outras palavras, dado o excesso de democratização da viatura individual, é, no país do interior rural, um enorme problema dada a escassez dessa mesma democratização. Aconselha-se a leitura desta peça, que traça o panorama geral, (depressa porque estes artigos tendem a desaparecer) e a procura de soluções em Bragança, Beja e em Castela-Leão.

 

A mensagem é a seguinte: a mobilidade é um direito, tornando-se por isso uma questão social por excelência e o automóvel simplesmente não é capaz de suprir esse direito em todo o lado. O país urbano é prejudicado pelo excesso do seu uso e o país rural é prejudicado pela falta do seu uso. Enquanto eu, vivendo em Lisboa, não me sinto prejudicado (e não prejudicando ninguém) por não usar um carro no acesso aos serviços que melhoram a minha qualidade de vida, no interior teria de ter um carro para garantir esse mesmo acesso; a questão é que ninguém deve ser obrigado a ter carro, mas deve ter direito à mobilidade. São coisas diferentes.


A Câmara Municipal do Porto instalou um brinquedo inócuo que diz aos peões quanto tempo têm para não morrer atropelados. Aumentar o tempo de passagem nas passadeiras complica sempre as contas dos engenheiros de tráfego.


Perante o novo plano de austeridades, a Associação Académica da Universidade do Algarve bate-se pelos direitos dos seus alunos. Como? Mais estacionamento para os carros dos estudantes, ora pois. Ver aqui (foto tirada do Spectrum).

O saber não ocupa lugar?

TMC, 16.10.09

 

O panorama que este blogue tem traçado do país não é animador. Até parece que, para além das pessoas que nele colaboram e do punhado de leitores, há uma completa ignorância das medidas a tomar em termos de transportes em geral e contra o automóvel em particular.

 

Não é o caso. Existe em Portugal plena consciência dos problemas, desafios e medidas a tomar. Na nossa academia temos reputadas potestades em planeamento urbano, mobilidade sustentável, ordenamento do território; há doutoramentos em desenho urbano, car-pooling, biocombustíveis, optimização de frotas dos transportes públicos, etc.

 

Podemos dizer então o problema parece ser que esse conhecimento não escoa para a sociedade civil e para os decisores; ou que então o ritmo do escoamento é demasiado baixo ou que a complexidade do problema parece obviar qualquer resolução.

 

Eu por mim acho que falta qualquer coisinha, um je ne sais pas de quoi óbvio mas que é muito nosso, muito português e que nos tolda os olhos.

 

Alameda Universitária de Lisboa

Metro: Campo Grande, Cidade Universitária, Entrecampos

Autocarros: 21, 36, 31, 35, 44, 49, 64, 701, 738, 755, 768

Comboio: Estação de Entrecampos

 (clique na opção Ver imagem do Firefox para ampliar)

 

A alameda relvada ainda escapou.

 

 (clique na opção Ver imagem do Firefox para ampliar)

 

Na parte direita da fotografia havia uma escola chamada Cidade Universitária.

 

Instituto Superior Técnico

Metro: Alameda, Saldanha  (três linhas)

Autocarros:  7, 10, 16, 17, 35, 36, 44, 83, 708, 718, 726, 727, 732, 738, 742

 

 

Gosto especialmente das marcas de estacionamento em cima dos passeios.  Nas próprias barbas duma escola de suposta excelência em arquitectura, engenharia e ciências, os alunos habituam-se cedo aos grandes exemplos.

 

 

Funcionários, investigadores, professores e alunos finalistas têm direito a estacionamento gratuito.

 

O caso do Técnico é ainda mais flagrante porque está bem no centro da cidade. Qual é a legitimidade das próprias universidades apregoarem aquilo que não cumprem? Qual é o impacto na saúde, no trânsito e na cidade dos automóveis que estas universidades albergam? Quantos lugares ocupa ilegitimamente este saber?

 


 A polémica também existe do outro lado do Atlântico. No excelente blogue urbanidades, ler a reacção de Moacir Pereira às implicações no tráfego da cidade da Universidade de Santa Catarina.

 

Campus Universitário à Portuguesa!

António C., 25.10.07
Quando estava no meu 3º ano da Universidade, um professor durante uma aula perguntou quantos de nós usávamos regularmente o carro para nos dirigirmos até à Universidade.

Mais de metade levantou o braço.

Os abusos da utilização massiva do automóvel pela população Universitária, resultam em zonas totalmente descaracterizadas onde impera o estacionamento selvagem em cima dos passeios,  em segunda fila ou em qualquer lugar que dê para deixar o tão estimado carrinho.

Qualquer baldio é um parque, qualquer zona que poderia ser de lazer é ocupada por automóveis. Já conheci vários estudantes de muitos países europeus e muitos se mostravam surpreendidos quando lhes dizia que mais de metade dos meus colegas se deslocavam diariamente de carro para irem à Universidade. Afinal de contas quem é o pai desnaturado que não oferece um carro ao filho assim que este entra na universidade?
Familías, mais ou menos ricas à parte, vejam-se algumas fotos de duas zonas universitárias em Lisboa:



Vemos aqui a zona da antiga Escola Secundária da Cidade Universitária. Para quando restringir toda esta zona a lugares marcados e pagos?  Sim, deve ser uma situação  temporária, no entanto o terreno está a ser usado e ninguém é compensado por isso.

Pior mesmo é a situação que se vive no Instituto Superior Técnico:





O que será que podemos esperar de alunos de uma Universidade como o Instituto Superior Técnico onde se leccionam cursos de Arquitectura e Eng Civil, e onde existem diversos departamentos de estudos territoriais, mobilidade e transportes?

Será normal desenhar lugares de estacionamento em cima da calçada? Surreal? Não. É mesmo assim o parque dos automóveis no Instituto Superior Técnico, uma zona muito bem servida de transportes públicos, e onde existem ainda alguns parques subterrâneos.

Já agora deixo uma questão, não faria sentido aumentar a idade da autorização para tirar a carta de condução para 21 anos e oferecer transportes (ainda) mais baratos aos estudantes universitários?  Tendo em vista, claro, uma menor dependência futura deste meio de transporte.