Há anos que a União Europeia chateia Portugal, por Portugal considerar que o atravessamento das pontes sobre o Tejo de carro é um bem de primeiríssima necessidade, ao ponto de as portagens pagarem menos IVA que bens de luxo e fúteis como bolachas, papel higiénico, detergente, conservas de peixe, pêssego em calda, margarina, etc. Isto é as portagens pagam 5% (uma taxa supostamente exclusiva para bens fundamentais), enquanto os exemplos que dei pagam 12% ou 20%.
Vá se lá saber porquê, a UE não concorda com a definição portuguesa ao ponto de ter feito queixa no Tribunal de Justiça Europeu, que deu razão à UE.
Mas o nosso bravo governo - aquele que acha que os carros eléctricos merecem descontos fiscais por serem ecológicos, mas as bicicletas não - não desiste. Está disposto a bloquear todo um processo negocial entre os 27 sobre os impostos sobre o consumo, usando o seu poder de veto se não vir satisfeita a sua exigência (que é apenas e só esta).
Estou a imaginar 27 representantes europeus a chegar a um acordo, daqueles sempre difíceis de alcançar por terem que ser unânimes, e o português levanta-se e diz "eu bloqueio isto tudo, porque vocês não percebem que atravessar de carro uma ponte, onde há comboios e autocarros, é um bem de primeira necessidade"*.
É raríssimo eu dizer isto, mas hoje tenho vergonha de ser português.
* E não é que o insólito aconteceu mesmo?! Palavras do próprio ministro: "Portugal votará [vetará] contra qualquer acordo que não contemple a questão das pontes. (...) afecta um número muito significativo de portugueses designadamente em zonas urbanas onde a travessia das pontes é fundamental".
** Isto está cada vez melhor. O ministro à TSF não disse "às armas, pelo popó lutar" mas quase... "Portugal vai lutar até ao fim".
*** Já tinha referido esta notícia num post antigo, mas só agora notei que um dos argumentos do governo português para manter o IVA baixo, era que só assim se garantiria uma concorrência sem distorções entre os meios de transporte na ponte. Isto é dos maiores disparates económicos que ouvi nos últimos tempos. Uma coisa essencial para evitar distorções na concorrência, é garantir que os preços reflectem os custos. No caso do automóvel a diferença entre o que se paga e o custo real é tão abissal, que dar importância a uma dúzia de cêntimos é desviar a conversa.
**** A Pátria venceu mais uma dura e importante batalha!
***** Quando eu achava que história não poderia tornar-se ainda mais ridícula, o ministro das Finanças voltou a surpreender-me. Além das portagens, as fraldas estavam na mesma situação: Portugal tinha um IVA demasiado baixo. Não discuto qual seria o IVA justo para os dois produtos, mas quando o ministro faz um estardalhaço enorme numa reunião com 27 países de modo a manter o IVA baixo para as portagens, e não abre a boca em relação às fraldas para bebé (que seria uma luta mais fácil já que nem estaria sozinho como no caso das portagens), eu acho que se ultrapassou qualquer limite de razoabilidade. Só prova as nossas aberrantes prioridades sociais.