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Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Menos Um Carro

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Ainda bem que não podemos alargar as nossas avenidas!

MC, 22.03.22
Parece unânime que a solução ideal para a Almirante Reis seria poder alargá-la uns metritos para caberem lá todos (estacionamento, carros, peões, ciclovia, autocarros, etc) como nas mais recentes avenidas de Lisboa, como a da foto.

1.jpegDiscordo. Ainda BEM que não podemos alargar as antigas avenidas!

 
A ideia de alargar as vias para satisfazer todas as necessidades de espaço urbano, está bem patente no urbanismo mais recente: a Alm Reis tem menos 5m de largura que a Rua Helena Vaz da Silva (rua secundária na Alta de Lisboa) onde não falta estacionamento e passeio largo.

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O problema é que esticar a cidade para haver espaço para o automóvel (estacionamento, várias "faixas"), implica esticar as distâncias, o que desincentiva especialmente os peões e o Transporte Público. 10min a pé são ok para ir até supermercado/escola/metro, mas 20min não. Densidade menor também implica menor número de pessoas/lojas servidas por um autocarro/metro.
Veja-se quantos lugares estão num raio de 200m de uma paragem de autocarro em Arroios vs Pq Nações (fotos com mesma escala). Isto torna o autocarro/metro financeiramente insustentável por servir menos pessoas - mas o carro tem sempre lugar à porta:

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Vias tão largas implicam necessariamente grandes cruzamentos/rotundas. Nenhum peão ou ciclista se sente seguro a atravessar coisas destas (foto abaixo), já para não falar nos minutos extra perdidos na deslocação. A Alta de Lisboa tem quatro rotundas que são maiores que quarteirões inteiros de Arroios!

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A consequência é óbvia. Vejam quantas pessoas andam a pé em bairros densos de Lisboa (Arroios, Cp Ourique, Av Novas), e quantas o fazem nos Olivais (foto abaixo), Pq Nações, Alta Lisboa, etc. É impossível uma cidade ser ao mesmo tempo amiga dos peões/bicicleta/TP (todos requerem cidades densas), e ao mesmo tempo do carro pelo espaço que este exige.

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O mais triste da baixa densidade é que nunca será corrigida. Mesmo quando reduzirmos estacionamento à superfície e dermos prioridade ao peão (meio século depois da Europa), as distâncias continuarão a ser grandes a pé, inviabilizando comércio local, TP, escolas de proximidade. Isto é obviamente pior para bairros cercados por vias-rápidas como Carnide (comparação com Arroios na foto, mesma escala), Alfornelos, e quase todos os arredores de Lisboa.

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P.S. Vá, admito que a Almirante Reis até poderia ter mais uns 4 metritos, para que houvessem corredores BUS e os autocarros e elétricos não ficassem presos no congestionamento dos outros.

Só um carrodependente é que não quererá perceber que é impossível o Estado não interferir na escolha de mobilidade

MC, 28.07.20
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Quando és carrodependente e o único modelo de cidade que conheces são as portuguesas (o carro é rei, os outros ficam com migalhas), é fácil convenceres-te que qualquer migalha extra para os outros é uma interferência da câmara/Estado na tua liberdade de escolha.
 
Mas a grande "interferência" vem muito atrás; aconteceu quando se escolheu que a cidade era do carro, e os restos eram para os outros. Não há nenhuma razão divina para as cidades serem assim. Aqui ao lado, Barcelona tem cada vez mais ruas residenciais que são predominantemente pedonais.

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No fundo é impossível o Estado não interferir, tal como é impossível que 90% da rua para o carro + 90% para o autocarro + 90% para o peão + 90% para bicicleta dê 100%. Ao não quereres perceber isso, não estás a ser democrata e liberal, mas pura e simplesmente egocêntrico.
 
Tenho a certeza que muitos nobres durante as revoluções liberais, e muitos brancos no fim do apartheid, devem ter pensado exatamente o mesmo: "lá está a malandra da câmara a interferir na minha liberdade e nos meus direitos".
Não está. Está a acabar com privilégios.

O planeamento urbano centrado no automóvel causa sedentarismo e obesidade

MC, 27.07.17

O sedentarismo é provavelmente o maior problema de saúde pública mundial neste momento, responsável por mais de 5 milhões de mortes por ano.
Um estudo inovador publicado na Nature, teve acesso ao número de passos dados no dia-a-dia, registado por 700 mil smartphones em todo o mundo. O estudo mostra que a obseidade está fortemente relacionada com estes dados.Mostra ainda que quanto mais uma cidade for feita e pensar nas pessoas em detrimento do automóvel (mais "walkable"), menos obesidade há. E isto acontece para todas as idades, géneros, níveis de rendimento, etc.
No gráfico vemos que a "activity inequality" (associada à obesidade), tem um agravamento de 40% devido apenas à qualidade do espaço urbano.

Ter cidades mais amigas dos peões, com passeios mais largos, com menos esperas nos semáforos, sem pontes e túneis pedonais, sem vias-rápidas no centro da cidade, com travessias mais seguras para os vulneráveis, sem estacionamento (legal ou ilegal) a dificultar a circulação pedonal, etc. é um dever de saúde pública.

In more walkable cities, activity is greater throughout the day and throughout the week, across age, gender, and body mass index (BMI) groups, with the greatest increases in activity found for females. Our findings have implications for global public health policy and urban planning and highlight the role of activity inequality and the built environment in improving physical activity and health.

http://www.nature.com/nature/journal/vaop/ncurrent/full/nature23018.html#sf9-inarticle

 

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Radares

TMC, 20.04.10

 

Quando surgiram, os radares foram apelidados de, e cito de memória, um “atentado aos direitos dos condutores”, uma “caça à multa” e outros protestos quejandos, vindos de um grupo de pessoas que, não sendo automobilista profissional, pretendia fazer finca-pé dessa regalia de usar algumas ruas de Lisboa e Porto como pistas para os bólides. Uns protestaram porque achavam tudo muito natural, outros, mais temerários, até se atreveram a falar em ganhos ou perdas de tempo e até de produtividade. Enfim. Compreende-se este alarido. Para o curioso, não deixa de ser extremamente irónico haver um grupo de pessoas dispostas a perder tempo a defender os direitos dos automóveis. Mas não é assim tão simples.

 

Os resultados até são indesmentivelmente positivos. O efeito psicológico do número 50, envolto numa auréola vermelha lembra esse limite que, no velocímetro, está logo no princípio da escala. 50km/h. É esse, afinal, o limite previsto pelo código da estrada e que tem razão de ser: a partir dessa velocidade, um impacto entre peões e automóveis é quase uma garantia de morte certa para um deles e de pena suspensa ou ilibação para o outro. Há, assim, uma prevenção de segurança por precaução das velocidades praticadas; e os próprios números de sinistralidade, segundo a Polícia Municipal, têm diminuído.

 

Não deixa de parecer absurdo, porém, ao automobilista comum, que o seu bólide, marcando velocidades até, pelo menos, os 120km/h (o limite nas auto-estradas) tenha que se restringir a essa mísera meta de 50km/h nas cidades. Uma miséria. Não se compreende. Se o código da estrada apresenta limites de 50km/h para as localidades e de 120km/h para as auto-estradas – o percurso comum do automobilista comum que reside num subúrbio – porque teriam as empresas construtoras de automóveis construído motores que permitem ultrapassar esses limites sem dificuldades? Porque somos constantemente bombardeados com a potencial rapidez e robustez dos automóveis, escarrapachada de forma quase pornográfica em anúncios de rádio, televisão e revistas?

 

 

Estremunhado, na cama, é frequente ouvir da rádio um anúncio da Autoridade para a Segurança Rodoviária com gritos e música melancólica, logo seguido de outro apelando o leitor a comprar um carro e das respectivas características.

 

Mas os absurdos não acabam aqui e, para mim, nem são sequer os mais graves. Não sei qual dos fenómenos foi responsável pelo outro; desconfio até que sejam mutuamente originantes. Basta olhar para as estradas em que foram colocados os radares. São largas, desérticas, de pelo menos duas faixas em cada sentido, sem edificado e algumas até têm um ou outro peão, que se aventura num ambiente que não é o seu. São autênticas auto-estradas urbanas que rasgam a cidade. Perante este tipo de estrutura, como não acelerar para além de 50km/h?

 

 

Foram os urbanistas que também permitiram, através da forma dada à cidade, que os condutores tenham essa prática espontânea de acelerarem acima do limite legal. As estradas com radares são hoje elementos estranhos ao seu tecido e que foram construídas com o propósito de satisfazer os paradigmas de velocidade e poupança de tempo. Paradigmas falsos.

 

Medidas avulsas como os radares são bem-vindas mas devemos recordar-nos que são remendos possíveis no erro crasso de origem. Como alguém que tendo começado a construir a casa em areias movediças acha que tem de mudar a cor das paredes.

Lisboa é um parque de estacionamento I

MC, 22.01.10
Eu não entendo bem o que é o problema da falta de estacionamento que alegadamente existe em Lisboa. Como mostrou e muito bem o Carlos Medina Ribeiro Lisboa não tem falta de estacionamento, os lisboetas é que têm falta de vontade de pagar por ele.

Sejamos sinceros, Lisboa é um parque de estacionamento. E não me refiro ao estacionamento irregular que abunda como em nenhuma cidade europeia (bom, talvez Nápoles), refiro-me a estacionamento legal à superfície. Veja-se isto:


Uma rua estreita (passeios minúsculos) com QUATRO FAIXAS para estacionamento. Lisboa tem quilómetros e quilómetros de ruas assim. Quatro faixas de estacionamento à superfície é impensável nas cidades do Norte da Europa. Nas cidades mediterrânicas encontra-se uma ou outra rua com mais de 2 faixas, mas sempre em ruas largas. Passem uns tempos no Google Maps, e verifiquem pelos vossos próprios olhos.

 

Este abuso de estacionamento legal torna a cidade feia, desagradável, tira espaço público que deveria ser para peões, esplanadas, jardins e até campos de jogos para os miúdos. Pelo seu baixo preço (ou mesmo gratuito para os residentes - algo que também não se repete noutras cidades europeias) é um perverso incentivo à posse e ao uso do automóvel na cidade. Por favor, não me contem a história do despovoamento da cidade por falta de estacionamento. Se há cidade que tem problemas de despovoamento na Europa, ela é Lisboa, a cidade parque de estacionamento.

 


O Passeio Livre tem uma posta antiga bem a propósito: em Oeiras, um estacionamento em altura construido pela câmara para os residentes num local com pouco estacionamento na rua, não tem fregueses... paga-se.

As Auto-Estradas Urbanas Esvaziam as Cidades

MC, 09.12.09

Pegando na posta do TMC, deixo aqui a principal conclusão de um estudo do economista Nathaniel Baum-Snow da Brown University sobre a fuga para os subúrbios nas cidades americanas causa pela construção de auto-estradas. O estudo mostra que por cada auto-estrada radial construída numa cidade, a sua população decresce 18% face aos valores que teria sem a sua construção. Embora o resultado se aplique a cidades americanas - cuja lógica urbana e de mobilidade é totalmente diferente da europeia - não há aparentemente nenhuma razão para que o resultado seja muito diferente por cá.

As causa são óbvias, o melhor acesso ao centro torna os subúrbios mais apetecíveis. E as consequências também o são: mais congestionamentos, mais custos de mobilidade, mais poluição, mais problemas de gestão do espaço público no centro (estacionamento), cidades mais vazias logo menos humanas e mais inseguras, pior cobertura dos serviços sociais (hospitais, escolas), etc.

E é muito importante que nos lembremos disto sempre que se fala em construir mais uma auto-estrada. Aumentar o IC19 ou construir uma ponte para o Barreiro, não só prejudica a cidade no curto prazo por aumento do tráfego, mas no longo prazo por esvaziamento dela. E Lisboa e Porto já são um péssimo exemplo nesta dispersão. Embora Lisboa e Porto sejam a 20ª e a 56ª maiores áreas urbanas na Europa, Lisboa tem apenas o 47º centro mais populoso na Europa e o Porto nem aparece no Top100.

 

 


O bananalogic e o A Nossa Terrinha mostram muito bem como as ciclovias mal planeadas podem prejudicar os ciclistas urbanos, o primeiro com o exemplo da ciclovia em Campolide e o segundo em Oeiras. Têm aparecido muitíssimos exemplos destes por todos o país, fruto da pressão de mostrar obra feita, do desconhecimento técnico sobre ciclovias, da falta de coragem de incomodar o automóvel e da incompreensão de quem as ciclovias não são sempre uma boa solução.

A cidade como corpo (II)

TMC, 24.10.09

A metáfora que encara a cidade como corpo tem várias qualidades interpretativas. Para além do mais, não devemos só apreciar o seu valor metafórico; uma cidade deve ser, tanto quanto possível, um corpo, nomeadamente, um corpo orgânico.

 

E porquê? Um corpo orgânico tem unidade; as suas partes não são completamente autónomas, antes necessitam de colaborar para que o conjunto possa funcionar; um corpo não é apenas o conjunto dos seus orgãos, das suas partes, mas sim uma certa maneira destes funcionarem. Uma qualquer maleita  é rapidamente restaurada localmente enquanto que um dano mais grave numa certa parte pode, de facto, afectar todo o corpo, torná-lo doente.

 

(clique na opção Ver imagem do FireFox para ver maior - talvez o maior nó rodoviário do país; o planeamento não existe: o que há é uma camada de estruturas adicionadas a outras em diferentes momentos: agrícola urbana, rodoviária, eléctrica: os interstícios sem uso e função assinalam este modo de construír)

 

Ora, as nossas cidades, no seu desenvolvimento, assemelham-se a tudo menos a um corpo. Ameaçam tornar-se numa amálgama disforme de partes sem qualquer conexão, um conjunto híbrido sem identidade; são apenas um amontoado de pessoas, de prédios, de vias de ligação. Ao chamarmos-lhes cidades pressupõe-se de imediato a sua unidade (porque agregamos tudo isso num substantivo), mas, como atestam os conflitos entre peões e automóveis e a dispersão urbana, as cidades s parecem ser mais modos descontrolados de crescimento de certas partes de um conjunto de coincidências espaciais.

 

As nossas cidades não funcionam como corpo porque não cresceram num sentido natural: os seus constituinte têm sido construídos de modo avulso. As cidades estão doentes. E tal como não existe um único médico que trate de todas as maleitas de um corpo, dada a sua complexidade, não devemos relegar para as autarquias a elaboração de um plano geral que simultaneamente diagnostique e restaure a saúde da cidade. 

 

(clique na opção Ver imagem do FireFox para ver maior; a famigerada Praça de Espanha, um corpo estranho entre bairros residenciais; talvez esta aberração queira compensar a existência nas proximidades do excelente jardim da Gulbenkian?)

 

Até porque os urbanistas, arquitectos e responsáveis pelo planeamento, qual corpo médico urbano, têm por hábito a cura de algumas partes como se estivessem desligadas das outras. Isso é totalmente inadmissível. No caso humano, seriam acusados imediatamente de negligência e falta de profissionalismo - por óbvio desconhecimento da anatomia do corpo - mas na cidade, a omissão e o esquecimento de outros constituintes é o que ocorre com mais frequência. Porquê?

 

A minha opinião é que, tal como um indivíduo não é só a sua mente, também a cidade não pode ser a sua autarquia, o seu corpo dirigente. Há problemas que têm de ser resolvidos e sarados pelo próprio corpo e sem a necessidade de intervenção da mente: uma ferida cicratiza--se sozinha, sem a nossa intenção. Ao mesmo tempo, a autarquia deverá saber quais as partes da cidade a tratar porque, tal como num corpo, a sua pele, o seu sistema nervoso, lhe comunica as respectivas necessidades.

 

(clique na opção Ver imagem do FireFox para ver maior; Lumiar, Lisboa, séc. .XXI: haverá alguma fotografia que denuncie maior amálgama urbana do que esta? É praticamente possível a um leigo fazer a arqueologia dos seus constituintes)

 

Seguindo esta metáfora, se os cidadãos são realmente a pele da cidade, o que há, hoje em dia, é um entorpecimento, uma autêntica anestesia geral; ao mesmo tempo, se as cirurgias urbanas se limitarem a obras desligadas do contexto, o que aparecem são baldios, guetos, não-lugares, espaços com apenas uma  de várias modalidades possíveis - um corpo não tem constituintes supérfluos, as nossas cidades primam pelo desperdício. À irresponsabilidade dos urbanistas segue-se a despreocupação e o alheamento dos cidadãos. O seu espaço é unicamente o privado e qualquer problema público é relegado em exclusivo para a junta de freguesia ou para a edilidade.

 

 (clique na opção Ver imagem do FireFox para ver maior; Av. Conde Valbom: um bom e raro exemplo em que a parte (tal como um orgão serve o corpo) - existe mas servindo toda a cidade: os automóveis podem circular mas, tal como o piso indica, não há separação entre o espaço dos peões e o espaço dos veículos a motor; há arborização, esplanadas, bancos para relaxar, comércio: estaremos mesmo em Lisboa?)

A cidade como corpo (I)

TMC, 20.10.09

Eis outra notícia que assinala a incompetência e falta de preparação dos responsáveis pela rede rodoviária nacional. O Observatório de Segurança de Estradas e Cidades assinala que a própria formação em engenharia civil não salvaguarda todas as considerações para de segurança nas estradas, nomeadamente no fenómeno conhecido como hidroplanagem.

 

Isto corresponde à minha ideia de que a sinistralidade rodoviária não se deve apenas a hipotéticas distracções humanas ou  a esporádicas transgressões do código da estrada. Não estou a argumentar no sentido de que o desenho e o planeamento urbano condicionam totalmente os automobilistas e os peões ao ponto de não ser possível a atribuição de imputabilidade; mas sem dúvida que a própria estrutura física influencia o comportamento.

 

Ora, quem projecta, elide e delimita as nossas estradas, passeios e edifícios tem uma tremenda responsabilidade: o planeamento urbano deve orientar-se não só pela natureza dos constituintes móveis da cidade mas sobretudo pela natureza das relações que esses constituintes manterão entre si. Se um automóvel é por natureza um veículo que pesa algumas toneladas, alcança velocidades vertiginosas (a base compativa de velocidades deve ser sempre a humana) e o peão é por natureza indisciplinado no sentido que tem muito mais mobilidade - reparem como os automóveis só vão onde as estradas os deixam e segundo o que o código da estrada permite, ao invés que o peão vai onde quer - qualquer modificação na estrutura física da cidade terá de ter estas características em conta.

 

Se as ruas, os passeios e as praças forem projectadas tendo em conta apenas a natureza de um elemento móvel e não a relação entre os vários elementos móveis, o que acontece é a segregação de uns através do domínio de outros. É o que observamos nas nossas cidades:

 

- avenidas cuja largura e linearidade convidam a altas velocidades

- passeios diminutos que mesmo assim são galgados

- sacrífico generalizado do espaço público ao espaço automóvel

- domesticação da liberdade pedonal a guetos de atravessamento (também conhecidos por passadeiras)

- falta de arborização: quem está debaixo de um tejadilho metálico já tem sombra; ao mesmo tempo, as árvores na cidade são dissuassoras de altas velocidades para além dos seus inúmeros efeitos benéficos

- os buracos nos passeios, os baldios e jardins abandonados precisam de anos de denúncias para serem restaurados; os buracos nas estradas depois de uma chuvada são arranjados em poucos dias

 

Estes são os aspectos mais passivos de um planeamento conceptualmente segregador; a interacção física propriamente dita entre os vários modos, quando ocorre, resulta invariavelmente no prejuízo do elemento mais frágil; e entre a morte e o bem-estar há muitos graus de insegurança e incomodidade. Os acidentes não ocorrem apenas devido ao desleixo dos intervenientes; antes, são proporcionados pela sobreposição deficiente da estruturas dos nós rodoviários à estrutura pedonal, uma sobreposição que tomou em conta apenas a natureza de um dos intervenientes.

 

Planiamento Urbâno

MC, 17.12.07
Há uma coisa que os estrangeiros falam que é o tal de "planeamento urbano" (ou ordenamento do território num sentido mais geral). Parece que dedicam algum tempo a pensar como organizar as novas zonas habitacionais, industriais e comerciais antes de as construir. Consta que assim conseguem balancear habitação, serviços e empregos, distribuir espaços verdes para todos, facilitar o acesso de todos (seja a pé ou de veículo) a pontos fundamentais, elaborar uma rede de transportes que dê acessibilidade a todos, criar uma rede de vias principais por onde é canalizado o tráfego e os transportes públicos deixando as restantes para o pouco tráfego de bairro o que permite que os transportes públicos sejam mais eficientes, etc...
Aqui na terra, planiamento urbâno é quando a gente decidiu construir um conjunto de prédios e nos lembramos que o pessoal tem que ter acesso a eles, então construímos uma rua até à rua mais próxima. (Numa conferência sobre transportes na cidade há uns anos, foi bem curioso ver a enorme surpresa de um engenheiro alemão quando soube que a aprovação de novas urbanizações não dependia de um estudo de acessibilidades).

Para perceberem aquilo que me refiro, fica aqui uma adivinha. Qual das seguintes fotos, tiradas do Google Maps, é dos arredores de Lisboa?
As outras são dos arredores de Barcelona, Amesterdão e Praga, escolhidas apenas por terem uma dimensão semelhante a Lisboa. Clique para ver em promenor.

A.


B.


C.


D.