Uma lição de coragem contra os automóveis para os autarcas portugueses, vinda de Milão
Milão é a única cidade do Sul da Europa com um sistema de portagens urbanas, isto é, obriga o carro a pagar a entrada na cidade, de modo a reduzir o seu número. Quando a medida foi lançada em 2008, eu teci algumas críticas porque distinguia os carros "verdes" (na realidade 60% do total), dos poluentes. Só os segundos pagavam portagem. Focar-se exclusivamente no aspecto ambiental, era esquecer todos os outros problemas que o automóvel cria na cidade.
Mas tal como fez Estocolmo, Milão quis ter um período experimental e depois perguntar à população o que achava. E tal como acontece em tantos casos de restrição ao automóvel, há uma enorme oposição antes, mas um enorme apoio depois da implementação. No Verão passado foi feito um referendo que perguntava a opinião sobre o alargamento a todos os automóveis das portagens, o incentivo ao meio de transporte público e a pedonalização do centro. Mais concretamente, propunha-se
a) duplicar a área pedonal
b) duplicar as zonas 30, e acalmia de tráfego
c) 300km de ciclovia
d) favorecimento ao transporte público, para aumentar a sua velocidade
e) serviço de autocarros de bairro
f) aumentar o bike sharing para 10000 bicicletas, e car sharing para 1000
g) alargar o horário do metro
...
k) alargamento da portagem a todos os carros (excepto residentes)
Os milaneses foram bem claros na resposta: 79%, ou seja 4 em cada 5, apoiaram as medidas de combate ao automóvel.
A portagem de 5€ para todos, durante o dia, arrancou há um mês, e o Treehugger tem um artigo sobre isso. A entrada de automóveis reduziu-se em 37%, os poluentes entre 14% e 37%. Mas o resultado mais impressionante, e que o Treehugger não refere, vem de um relatório camarário: entre as 8h e as 9h da manhã, a velocidade média dos autocarros aumentou 7%, e na hora seguinte 17%, de uma semana para a outra! Como sublinho sempre, não podemos exigir bons transportes públicos, enquanto não lhes tirarmos os carros da frente.
Milão não é Roma ou Nápoles, mas não deixa de ser Itália, não é na Noruega ou na Holanda. Não deixa de ser uma cidade onde o automóvel tem status, e onde o automobilista é rei. Os nossos autarcas deveriam aprender com este exemplo, em vez de assumirem sempre que a população não apoia este tipo de medidas e que só querem mais e mais estacionamento.
................................................................
Para o fim, mais uma lição vinda de Itália. Até uma cidade no sopé de uma montanha como Génova, pode ser amiga das bicicletas: