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Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Menos Um Carro

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Em Lisboa e Porto, transportes muito mais baratos não tiram carros da cidade

MC, 09.03.20

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Em abril de 2019 arrancou o PART, a forte redução do preço dos passes em todo o país. Em Lisboa teve a benesse extra (bem mais complicada) da revolucionária simplificação da bilhética, acabando com as centenas de passes que havia, reduzindo-o apenas a 2 tipos. Muita gente que tinha passe para os operadores A e B, até gostava de poder usar o C, mas esse passe ou não existia ou era excessivamente caro. De repente, toda a gente teve acesso a todos operadores relevantes.
Isto facilitou muito a vida dos utentes de transportes, e foi repetidamente apresentado como um grande passo na luta contra o automóvel. Sempre concordei com a primeira, mas torci o nariz à segunda. Como tantos estudos e experiências mostram, só desincentivando o uso do carro, é que as pessoas o deixam. As cenouras não servem para nada, sem um bom pau .
As autoridades têm publicitado muito os números dos transportes públicos (crescimento na utilização), mas nada se diz sobre a prometida redução milagrosa do uso do carro.
Felizmente os dados são públicos no IMT. Pegando no tráfego diário médio dos troços mais movimentados* em Lisboa e Porto, não se vê absolutamente nada a partir de abril de 2019 (nem agosto no caso de Lisboa, quando arrancou o passe família). Há uns com mais, outros com menos, mas não há nenhum padrão.
Só livraremos as nossas cidades da ditadura do automóvel, quando tivermos coragem de fazer o que tem dado resultado em todo o lado: menos estacionamento e mais caro, menos espaço urbano para o carro, portagens urbanas, etc.

Transportes grátis é uma medida assim-assim de quem não tem coragem de enfrentar o carro

MC, 04.03.20

Nota: post longo e polémico

O Luxemburgo tem sido notícia por ser o primeiro país, onde todos os transportes públicos (TP) serão gratuitos. Dizer "gratuitos" é obviamente uma maneira de distorcer o debate, porque o custo acaba por ser pago por todos (1600€ por habitante!) através dos impostos. É bastante consensual que o TP deve ser bem mais barato que o carro, para termos melhores cidades. A questão mais difícil é o como. Há essencialmente duas maneiras:
1. Baixar os TP, tê-los "gratuitos/pagos pelos outros", ou
2. Tornar o carro mais caro, ou seja deixar de o subsidiar fazendo os automobilistas pagar pelos custos que provocam: acabar com estacionamento subsidiado e alinhar preços com os restantes preços do m² na cidade; portagens urbanas; estradas financiadas por impostos sobre os veículos/combustíveis e não por outros impostos; taxas ambientais consoante a poluição atmosférica e sonora que causem; etc.
A primeira é politicamente popular e bem mais fácil de anunciar que a segunda. Mas as duas estão bem longe de ser equivalentes.
 
Quem paga as políticas?
No primeiro caso há vários casos de pessoas chamadas a contribuir sem qualquer sentido: as pessoas que moram em locais sem TP, as que ficam/trabalham em casa, as que vão a pé/bicicleta, as empresas e pessoas que fizeram o esforço para reduzir as suas deslocações, etc. saem prejudicadas.
No segundo caso, o custo do uso do carro é colocado sobre quem o provoca, o que é inequivocamente mais justo.
 
Que efeitos têm de diferente?
Há quem parta da ideia errada que mais uma viagem de autocarro significa necessariamente menos uma de carro, o que é errado. Décadas de estudos mostram que TP mais baratos aumentam o seu uso, mas têm um efeito quase nulo a tirar as pessoas dos carros. Um apanhado de centenas de estudos (1) começa logo por dizer que "car use is almost independent of bus and Underground fares". As estimativas apresentadas para uma descida do preço dos transportes de 10%, levam a uma diminuição do uso do carro entre 0,1% a 0,9%. Por comparação, a mesma descida de preços leva a aumentos do uso dos TP entre 3% e 10%. Estes resultados repetem-se noutros estudos, como (2) e (3).
Por outro lado, o uso do carro cai se optarmos pela segunda opção. Por exemplo em (2), diz-se que um aumento de 10% nos parquímetros no centro levam a -5,4% de viagens de carro.
 
Resumindo, se o nosso objetivo é tirarmos carros das cidades, baixar o preço dos transportes é uma medida politicamente fácil, que põe as pessoas erradas a financiar algo com fracos e até maus resultados. Em Tallinn, onde os transportes públicos foram tornados gratuitos, o uso do automóvel diminui apenas 5% a 10%, e o TP foi roubar utentes aos modos ativos (peões e bicicletas), que caem 35% a 40%.
Ambientalmente também são diferentes. Enquanto a primeira até pode levar a um aumento de poluição (se os operadores responderem ao aumento de procura), a segunda diminui sem a mínima dúvida.
Obviamente que se o nosso objetivo é outro, como tirar os idosos de casa ou apoiar as famílias carenciadas, a primeira política tem  resultados positivos. Mas para esses objetivos, parece-me haver outras medidas bem melhores.

Traduzindo para o caso português, concordo com a esquerda por querer uma forte diferenciação entre carro e TP, e com a direita por não querer pôr os outros a pagar. Infelizmente ninguém teve a coragem de defender a política que alcança os dois objetivos: taxar devidamente o carro na cidade.

Apanhado de Notícias da Semana da Mobilidade

MC, 24.09.07
  • CML iniciou rebaixamento de passeios em Campo de Ourique, com o objectivo de ajudar os peões, principalmente os idosos, os deficientes em cadeiras de rodas e os carrinhos de bebé. Embora seja uma boa medida, fica no ar a dúvida levantada pelo blogue Os Verdes em Lisboa: porque é que são os passeios a serem rebaixados e não o asfalto a ser levantado. E não é só uma questão de simbolismo.
  • Depois de uma dúzia de alterações, os bilhetes de transportes públicos em Lisboa vão finalmente ser (ligeiramente) intermodais. Ou seja os utentes só necessitaram de ter um cartão, que vai servir para o Metro e a Carris. A solução passa por ter um bilhete que se carrega com valores em euros, em vez de "uma viagem obrigatoriamente de autocarro" ou "três viagens obrigatoriamente de metro".  Fico sem perceber porque se insiste em complicar, e não se usa o sistema holandês onde um bilhete tem N unidades, e se usa um número diferente consoante a viagem, e funciona em todos os transportes públicos do país.
  • Depois de anos a promover a compra de automóveis em detrimento da bicicleta, a China, que enfrenta graves problemas de saúde pública, aderiu ao dia-sem-carros em mais de 100 cidades. Mas há também relatos que dizem que foi para ocidental ler e não ver.
  • O dia-sem-carros em Lisboa, acabou por não ser um dia-sem-carros mas um dia sem trânsito nenhum, excepto bicicletas. Lembro que nas primeiras edições apenas os automóveis privados estavam proibidos de circular. Desta vez os autocarros e os taxis não escaparam. Embora tenha sido uma dia simpático, passa a mensagem errada. Em vez de se tentar mostrar que a cidade pode viver sem automóveis privados, e que o dia-sem-carros poderia ser um dia banal do quotidiano, fica logo bem claro à partida que é um dia excepcional sem nenhuma lição para tirar.
P.S. Que as minhas bocas não escamoteiem o essencial: são todas excelentes notícias.

Condicionamentos ao Trânsito e Autoridade Metropolitana dos Transportes

MC, 12.07.07
Duas notícias interessantes no DD:

O condicionamento do trânsito, o incremento do uso dos transportes públicos e a eficiência energética nos edifícios camarários são medidas que o próximo presidente da autarquia lisboeta deve promover para reduzir as emissões de CO2, defenderam hoje especialistas.

As medidas foram apontadas à Lusa pelo presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), Fonseca Ferreira, pelo presidente da Quercus, Hélder Spínola, e pelo presidente da Liga para a Protecção da Natureza, Eugénio Cequeira.

Cerca de 80 por cento da poluição atmosférica é resultado das emissões produzidas por combustíveis fósseis na circulação rodoviária, avança o presidente da CCDR-LVT, António Fonseca Ferreira.

O responsável daquele organismo do Ministério do Ambiente afirma que existe um plano da qualidade do ar elaborado pela Universidade Nova de Lisboa que a autarquia de Lisboa devia ter começado a aplicar em 2005, o que, segundo Fonseca Ferreira, não aconteceu.

O condicionamento de trânsito é uma das principais medidas referidas pelo documento, «particularmente no eixo Avenida da Liberdade/Campo Grande», afirmou Fonseca Ferreira.

Na Avenida da Liberdade, «os níveis máximos de poluição foram ultrapassados em 145 dias durante o ano de 2006, quando as directivas europeias ditam que só podem ser excedidos 35 dias por ano», exemplificou o presidente da CCDR-LVT.

«O problema é que até agora não foi tomada nenhuma medida pela Câmara», lamentou Fonseca Ferreira.

Restringir o trânsito é igualmente a principal medida apontada pelo presidente da Associação Nacional de Conservação da Natureza, Quercus, Hélder Spínola.

Este condicionamento terá de ser acompanhado pela promoção do transporte público, mas para isso, alerta o dirigente ambientalista, «há que tornar os transportes públicos mais atractivos, confortáveis e económicos».

(...)

Mas a principal medida para reduzir as emissões de CO2, recomendada por Eugénio Sequeira, é também o condicionamento de trânsito, acompanhado do melhoramento da rede de transportes públicos.

«É preciso um metro radial e transversal, autocarros que façam o mesmo ou sejam complementares. Para convencer as pessoas a não trazer o carro é preciso que os transportes tenham boas ligações entre si, sejam cómodos e mais baratos do que actualmente são», conclui Eugénio Sequeira.

AMT´s concluídas após eleições, diz Ana Paula Vitorino
Mais vale tarde do que nunca. A instituição da AMT é o primeiro passo para que os péssimos transportes públicos (em termos de interoperacionalidade) de Lisboa e Porto passem de uma manta de retalhos onde cada um viaja para onde quer, faz os horários que lhe apetece, faz bilhetes conjuntos quando o rei faz anos, etc... para uma verdadeira rede de transportes públicos urbanos.
No meio do texto está outra boa notícia: Salientou ainda que a fase experimental do primeiro bilhete único vai começar a funcionar em Outubro, em Lisboa, envolvendo numa primeira fase a Carris e o Metro e alargando-se posteriormente à Soflusa.
Como já disse aqui na Holanda há um bilhete que serve para todos os transportes públicos do país. Em Lisboa são dezenas (centenas?) o que só dificulta e afasta os passageiros.

Validade dos bilhetes pré-comprados

MC, 19.04.07
Ao ler o título "CP: bilhetes pré-comprados não podem ter prazo de validade" de uma notícia do DD, pode se julgar por momentos que o absurdo prazo de validade de bilhetes teria acabado. Afinal o que está em causa é apenas a validade do dito enquanto o preço se mantém.
Ou seja, comprando 10 bilhetes hoje por 10€, daqui a uns meses o passageiro não os poderia usar mesmo que os 10€ ainda fossem o preço actual.
Fez bem o Provedor da Justiça ao proibir esta situação na CP, tal como já se tinha feito com o Metro de Lisboa que incorreu em idênticos atentados aos direitos dos passageiros. Actualmente a lei - que não está obviamente nas mãos do Provedor - apenas permite a perda de validade nos casos em que o preço é alterado (ou seja aumentado) e isso só pode ocorrer 15 dias depois da alteração.  As empresas são ainda obrigadas a trocar os antigos títulos durante 30 dias mediante o pagamento do acréscimo.
Em Paris, por exemplo, estes 30 dias são.. ad eternum. Bilhetes com 5 anos podem ser trocados pagando a diferença.
Mas a questão principal nem é esta. Mesmo nos casos em que os preços se alteram, não faz sentido os bilhetes perderem a validade. Ao comprar com antecedência o passageiro está a pagar por um serviço que ainda não foi prestado, com óbvias vantagens para as transportadoras. Quem é beneficiado por este desfasamento normalmente paga por ele: alguém que peça emprestado paga juros sobre o dinheiro que mais tarde vai devolver, as compras a pronto têm normalmente grandes descontos, as revistas fazem enormes promoções a quem compra uma assinatura por longo período de tempo, etc...
A própria inflação mostra o absurdo da questão. Os 10€ que paguei há um ano, são hoje equivalentes a 10.3€, logo eu não deveria estar a pagar mais se ainda não usufrui o serviço.
Isto é o que acontece na Holanda. Não há simplesmente prazo de validade. (Recomendo também este post).
Este caso é mais um exemplo do total desrespeito e prepotência das empresas de transportes públicos em Portugal. Só tenho pena que a concorrência não seja solução para este sector, senão seria óptimo ver esta gentalha a ir à falência.