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Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Menos Um Carro

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MUBi!

MC, 23.02.10

A ideia de uma Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta nasceu há um ano num encontro de ativistas da Bicicletada/Massa Crítica. Foi legalizada já há alguns meses, mas alguns atritos burocráticos e um vasto debate de alinhamento de rumos à partida impediu que ela aparecesse publicamente até há alguns dias.

A MUBi não nasceu contra a já bem estabelecida Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta, mas sim do reconhecimento de parte dos seus membros que o os desafios e os objetivos dos ciclistas urbanos são independentes daqueles do cicloturismo. Enquanto a FPCUB pretende representar todos os ciclistas, a MUBi centra-se num alvo mais específico - os utilizadores urbanos veiculares.

A MUBi teve então há dias uma reunião ao mais alto nível na CM de Lisboa, com o vereador de mobilidade Nunes da Silva, onde foram discutidos os planos das ciclovias, das bicicletas partilhadas, da acalmia de tráfego e da partilha das faixas BUS com os ciclistas aprovado no Orçamento Participativo da CML.

Muitos parabéns a todos!

 

Adenda: o relato da reunião já está online no blog da MUBi.

 

Para saber mais visitem a lista dos vários projetos em curso, as ações e o blogue da MUBi.

 


A assinar, uma petição pela modernização da Linha do Oeste (Cacém-Figueira da Foz) que atravessa uma das áreas mais povoadas e industriais do país, mas tem comboios que andam a passo de caracol em linhas não eletrificadas. (via A Nossa Terrinha)

Aceitar as migalhas da ditadura do automóvel?

MC, 22.10.09

Correndo o risco de ser polémico entre pessoas amigas que normalmente concordam comigo, não posso de deixar de notar que a submissão à lógica da sociedade automóvel está mais difundida do que se possa julgar. Muitas críticas ao paradigma automóvel são também elas feitas do ponto vista desse próprio paradigma.

Eu detesto a atitude do "sê realista, exige o impossível", não está em causa um radicalismo utópico da minha parte. Falo sim em vários casos que não passam de tiros no pé. Concretizo:

 

1. Vai ser construída uma ponte para peões e ciclistas sobre a 2ª circular em Lisboa (uma via-rápida dentro da cidade) e tenho lido imensos elogios à ideia. Claro que estaremos melhor com a ponte do que sem ela, mas isso não faz da ponte uma boa notícia.

Aceitar a ponte é aceitar que o local do peão e da bicicleta não é à superfície, mas por baixo ou por cima dela. Numa cidade humana, os peões e a bicicleta têm que andar na rua. não ficam com as migalhas do automóvel. Uma estrutura do género da ponte é algo que se vai manter durante longuíssimos anos, logo vai ajudar a prolongar a actual lógica da predominância do automóvel no espaço urbano, ironicamente sob a capa do pró-peão e pró-bicicleta.

 

2. O movimento pela manutenção das poucas linhas ferroviárias em Trás-os-Montes está em grande com um interessante documentário e várias iniciativas. Aquelas linhas têm um potencial turístico, logo económico, interessante e isso não pode ser descurado. Mas não serão algumas linhas que só servem algumas centenas de pessoas e que só permitem velocidades baixas que vão revolucionar a região. Trás-os-Montes (ou outra qualquer região abandonada) precisa é de ter pequenas cidades onde os jovens tenham possibilidades, onde haja equipamentos sociais e comércio para que não fuja tudo para Lisboa e Porto.

Deste ponto de vista o que é realmente uma vergonha é Bragança, Chaves e Macedo não terem comboio. Vila Real e Mirandela ainda têm linha (com comboios a 20km/h) que nem sei se ainda funciona. Isto sim é importante para a região.

 

3. A Avenida das Forças Armadas em Lisboa (que liga duas praças centrais da cidade) está tão apinhada de viadutos de vias-rápidas urbanas, que é impossível fazer a avenida a pé. Numa série de reportagens da SIC chamava-se a atenção para existência de uma barreira de betão onde deveria haver uma passadeira. A situação é tão grave que a inexistência da passadeira onde os automóveis passam a 90km/h, é apenas a cereja em cima do bolo.

 

4. Quando se pensa no quanto custa o uso do automóvel ou no quanto espaço urbano tem que ser sacrificado para que uma única pessoa se possa deslocar de automóvel, fazem-se cálculos que deixariam o lóbi-automóvel bem orgulhoso. O custo não é só a gasolina, nem o espaço necessário se resume à área física do automóvel.

 

Espero que os "visados" não se sintam ofendidos, nós estamos todos do mesmo lado, mas precisamos de ver o mundo por outros olhos.

 


Foto do Apocalipse Motorizado que mostra o mesmo tipo de atitude vinda de cicloativistas de Curitiba, numa acção em que pintaram a sua própria ciclovia. Reparem na sua diminuta largura e no mau estado do piso. Neste caso os automobilistas até agradecem que os ciclistas se confinem àquela bermazinha.

Michael Hartmann - Autobiografia V

MC, 14.04.09

Quando Michael Hartmann começou a caminhar no meio da rua, a polícia não gostou. Uma coisa é um carro enorme a ocupar o diminuto espaço do peão parado durante horas ou dias, algo que a polícia de Munique há 20 anos - e a nossa hoje - sancionava quando o rei faz anos, outra completamente diferente é um peão a ocupar uma pequena parte do enorme espaço dos automóveis durante alguns segundos, nem estando sequer parado. A primeira tolera-se, agora a segunda é um crime contra a humanidade. O Michael pediu várias vezes que lhe fosse passada uma multa equivalente à do estacionamento no passeio, mas sem sucesso. Como não havia enquadramento penal à altura do crime hediondo de Michael, a polícia começou a prendê-lo, para logo a seguir o ter que libertar por não haver fundamentos legais para a prisão.

O passo seguinte foi prendê-lo duas vezes num hospital psiquiátrico, alegadamente por ter comportamentos suicidas. Era portanto alguém que durante meses caminhou na estrada, e  que a qualquer momento poderia querer suicidar-se, mas estranhamente ainda não tinha encontrado nenhum modo de o fazer durante as caminhadas entre veículos de uma tonelada a alta velocidade. Mais uma estratégia da polícia que fracassou por falta de fundamento legal.

Pouco depois foi atropelado com alguma gravidade. O chefe da esquadra local passou no local do acidente e comentou "pois então, afinal não é assim tão seguro caminhar na rua".

Michael Hartmann - Autoschreck

MC, 04.04.09

Há muitos anos que ouvi falar de Michael Hartmann, um conhecido activista pelos direitos dos peões em Munique. Soube na altura em que um tribunal tinha decretado que ele não deveria ser penalizado por caminhar em cima dos automóveis estacionados no passeio, porque não o fazia com o intuito de danificar.

Exactamente, caminhar sobre os carros estacionados no espaço do peão. Um dia em que ia pelo passeio com a namorada, fartou-se de estar constantemente a interromper a conversa e afastar-se dela, por os carros estacionados ilegalmente impedirem a passassem de duas pessoas lado a lado. Fartou-se e foi em frente, tal como era suposto. Por se irritar com a ocupação do espaço dos peões por caixas de metal, decidiu também passar a ser peão no local reservado para as caixas de metal.

Já há uns tempos que descobri na net um documentário famoso sobre ele, o Autoschreck (algo como  Susto do Automóvel) de 1995, um "clássico" do activismo pró-peão e anti-automóvel, mas sempre tive receio de o referir. Convenhamos que o senhor tem um pouco de doido, e  ninguém gosta de associar doidos à sua causa. Mas à parte da sua figura, será que faz realmente sentido acharmos que alguém que decide caminhar pelo alcatrão é doido? Qual é a diferença entre um peão a ocupar a zona dos carros e um carro a ocupar a zona dos peões? Ainda por cima um carro que está na zona dos peões nem tem uma pessoa lá dentro, é apenas uma caixa de metal. Parece-me que o doido é o outro.

Como o documentário mostra (e nem precisava de mostrar), um peão a ocupar o alcatrão é violentamente maltratado pelos automobilistas, mesmo em frente às câmaras. Mas nunca vi um automobilista a estacionar no passeio e a ser violentamente tratado por um peão.

 

Aqui fica o documentário de 15min. Veja-se pelo menos dos 0:30 aos 1:30, onde numa cena trágica (um pouco à 24 Horas mas trágica e muito frequente) se mostra bem como a parte mais fraca na mobilidade é apenas uma formiga que pode ser esmagada acidentalmente.