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Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Menos Um Carro

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Portagens na 25 de Abril são hoje CINCO vezes mais baratas do que em 1966

MC, 31.07.11

A imprensa está hoje cheia de notícias que afirmam que as portagens na Ponte 25 de Abril estão hoje 15 vezes mais caras do que em 1966, quando a ponte foi inaugurada. Na altura custava 20 escudos, e hoje custa 1,45€. Claro que até os jornalistas que escrevem estas babuserias já ouviram falar em inflação, e certamente tomam em conta a variação geral dos preços ao longo dos anos quando escrevem notícias sobre outros preços. Ḿas quando se toca no sagrado automóvel, não há manipulação de números que seja demasiado tendenciosa para não se poder colocar na imprensa.

Se eles quiseram fazer as contas, façamos nós então como deve de ser. Usando a base de dados económicos da Comissão Europeia, podemos facilmente ver que os preços em Portugal subiram 71 vezes desde 1966. A portagem subiu apenas 14,5, logo está na realidade 5 vezes mais barata hoje.

Bom, mas hoje o rendimento dos portugueses até está mais alto mesmo descontando a inflação, "nominalmente" o PIB per capita está 216 vezes mais alto. Comparando* então com o rendimento o preço está hoje 15 vezes mais baixo.

 

*Esta comparação pode ser enganadora, mas esse tema dá pano para mangas.

 

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A DIF, uma revista gratuita de moda, dedicou o seu número de Julho quase inteiramente à... bicicleta!! Os temas vão desde o Bicycle Film Festival, à Massa Crítica, ao Bike Polo, aos tipos de bicicletas que existem, etc. É oficial: a bicicleta deixou de ser coisa de gente esquisita!

 

Comissão Europeia volta ao greenwash dos biocombustíveis

MC, 23.07.11

A Comissão Europeia, que quer que em 2020 os combustíveis tenham uma incorporação mínima de 10% de biocombustíveis (combustível produzidos a partir plantas), acedeu a algumas críticas que eram feitas a esta política, tendo redifinido o que considera ser um biocombustível

Uma das críticas prendia-se com o aumento da procura de cereais, que levou várias empresas agrícolas a ocupar florestas tropicais e terrenos ecologicamente sensíveis na América do Sul e na Ásia. Para evitar este problema, a CE exige agora que os cereais para os biocombustíveis provenham de terrenos que já eram agrícolas. Isto contudo não muda em nada o essencial: os biocombustíveis fazem concorrência aos alimentos na luta pelos recursos. Mesmo que as florestas não sejam destruídas para os combustíveis, sê-lo-ão para alimentação devido ao aumento de procura de espaços aráveis.

De qualquer modo, qualquer alteração legislativa nada faz para contornar os dois principais problemas desta aposta:

1. Os biocombustíveis chocam com a necessidade de recursos (terreno, mão-de-obra, água, etc.) para o cultivo de alimentos. O aumento do preço dos alimentos básicos que se tem observado nos últimos tempos, e que muitos têm atribuido ao crescimento dos biocombustíveis, não será mitigado pelas novas regras.

2. Os biocombustíveis servem para prolongar o modelo vigente de mobilidade. Uma mobilidade sustentável precisa de mais transportes públicos e menos de automóveis.

 

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A Agência Europeia do Ambiente é muito clara num dos seus últimos relatórios: se a UE não vai cumprir os limites de emissões de óxidos de azoto (dos piores poluentes automóveis) e a culpa é dos automóveis. O relatório diz que o sector rodoviário não teve o comportamento que era esperado.

O imponderável da segurança das bicicletas

TMC, 11.07.11
 

Este vídeo é impressionante e devia fazer-nos pensar.

 

Estamos perante a prova rainha do ciclismo mundial. Não há grandes dúvidas acerca disso. Todos os envolvidos são profissionais altamente qualificados. Todos eles estão alertados para os imprevistos de problemas técnicos, de saúde e de alterações atmosféricas.

 

Mesmo assim, um carro abalroou um ciclista e provocou a queda de outro. Ao condutor bastou alguma falta de jeito e a vontade de captar um melhor ângulo dos protagonistas da dianteira da volta para em breves segundos, e numa velocidade inferior a 50km/h, deixar marcas indeléveis nos corpos e no próprio resultado da etapa.

 

Perante isto, e a respeito da segurança dos ciclistas urbanos, é necessário perguntar se é verossímil olharmos para o condutor comum das nossas cidades como alguém passível de ser controlado por medidas preventivas. As mortes na estrada atestam que não, mas acontecem entre pares iguais, isto é, entre pessoas que estão igualmente equipadas com uma arma mortífera que pesa toneladas e é em simultâneo a sua protecção ou o seu túmulo metálico. Os ciclistas não tem armas nem defesas.

 

Podemos e devemos acrescentar uma imputabilidade a priori do veículo mais pesado (a "strict liability"); devemos endurecer as sentenças para com condutores irresponsáveis; devemos instalar estruturas de acalmia de tráfego como lombas, curvas sinuosas que tornem absurda a aceleração e devemos também limitar através de taxas de estacionamento o uso da viatura privada. Estas medidas não logram só um aumento da sustentabilidade da mobilidade, mas tornam as nosssas cidades mais aprazíveis. Só que, a meu ver, sobrará sempre a estas tentativas de controlo um elemento arbitrário e pernicioso. E ainda bem, porque senão seríamos menos humanos.

 

O ponto é que é precisamente este elemento arbitrário que provocará sempre vítimas entre os ciclistas urbanos. Será uma inevitabilidade estatística. Se desejarmos minorá-lo só há duas respostas:

 

A primeira é impormos um limite físico à velocidade nos próprios motores automóveis, reduzindo quase a zero a probabilidade de acidentes mortais. Isto teria como efeito criar uma classe de automóveis exclusivamente urbanos; ninguém quer ir para fora da cidade a velocidades inferiores a 50km/h.

 

A segunda é segregarmos as bicicletas do tráfego rodoviário. É uma resposta que exige mais dinheiro para as infraestruturas porque não se contenta apenas com as medidas suaves que alteram a legislação. Há inúmeros factos ilegais que são diariamente negligenciados, como é o limite de velocidades nas cidades (50km/h).

 

Possivelmente, a construção de mais infra-estruturas obrigaria a negociações no orçamento da câmara que até retirem uma maquia ao quinhão reservado ao trânsito automóvel. Continuariam a existir vítimas, mas maioritariamente seriam devido aos acidentes entre os próprios ciclistas, e logo, menos graves.

 

Há uma terceira resposta: manter a tese da integração e afirmar que fazer uma omelete sem ovos é impossível; i.e., qualquer integração entre o trânsito automóvel e os ciclistas ocasionará inevitavelmente vítimas, precisamente devido ao elemento não controlável do comportamento humano; esta posição costuma vir acompanhada por uma ambição a longo prazo de redução no uso do carro, mas usa os ciclistas urbanos como vitímas prováveis de uma guerra da qual nem os próprios sabem ser soldados.

 

Eu próprio ando todos os dias de bicicleta a par dos automóveis e é só perante vídeos como este que por vezes me apercebo da minha fragilidade numa bicicleta.

A volta a Portugal acaba em Lisboa. E daí?

TMC, 10.07.11

Hoje fiquei a saber que a 73ª volta a Portugal acabará em Lisboa, no dia 15 de Agosto. Apoiando o evento, a Câmara Municipal de Lisboa aproveita a página da volta para acrescentar o seguinte:

 

'LISBOA, BICICLETA E MOÇA...'

Ao associar-se ao maior evento velocipédico competitivo em Portugal, a Câmara Municipal de Lisboa continua a apostar na cultura da bicicleta nas suas mais diversas expressões. As duas rodas a pedal são cada vez mais parte da vida da cidade, agora com mais pistas cicláveis e adeptos deste meio de transporte e de lazer. A bicicleta já não é encarada apenas como instrumento de utilização lúdica ou recreativa, mas como um meio de transporte competitivo, individual e não poluente, tendo vindo a impor-se como alternativa ao transporte particular e um complemento ao transporte público, em percursos de curta distância.

Lisboa está mais ciclável do que nunca com o alargamento da rede de pistas e corredores. São 44 quilómetros cicláveis em segurança distribuídos entre a zona ribeirinha e as áreas e parques urbanos. Nesta política integrada de mobilidade sustentável, o município oferece 40 novos locais de estacionamento. Com capacidade para mais de 300 bicicletas, os parques são públicos e assumem localizam-se em pontos estratégicos da cidade (mercados, espaços culturais, zonas comerciais, interfaces de transportes públicos, parques urbanos).

 

É verdade que a câmara de Lisboa tem, nos últimos anos, favorecido a empresa de construção de estruturas para bicicletas, como ciclovias, estacionamentos e sinalética. Ninguém contesta isso. Só que infelizmente também ninguém contesta que uma câmara em que 70% do orçamento vai para a resolução de problemas associados ao tráfego rodoviário tenha interrompido o investimento em estruturas cicláveis, sistema de bicicletas partilhado, faixas BUS+BICI e acalmia de tráfego. Parece que quem apoia as bicicletas na câmara aproveita estas ocasiões para substanciar a sua posição com palavras, na ausência de acções concretas. Parece-me até que a empresa municipal que mais tem contribuído para o favorecimento do aumento do número de ciclistas é a EMEL, pois as suas novas políticas de estacionamento terão o efeito de inculcar nos condutores o uso complementar dos transportes públicos ou o desperdício que é trazer o carro para a baixa lisboeta.

 

O número de ciclistas em Lisboa aumentou, é um dado empírico; mas o número terá aumentado por diversos motivos: aumento do preço dos combustíveis rodoviários e do estacionamento, escolhas éticas ligadas ao ambiente, mudança de paradigmas de vida, aumento do número de empresas associadas à bicicleta, et.  A aposta na cultura da bicicleta favorece, claro está, que "as duas rodas a pedal sejam cada vez mais parte da vida da cidade", mas não esqueçamos que não existem números para suportar que essa ajuda deriva exclusivamente das parcas mas significativas ajudas da câmara. E não sabemos se os novos ciclistas apareceram por influência pessoal de amigos ou se por abrirem um dia a janela descobrirem que havia uma pista ciclável à sua porta.

 

Assim de repente, existem inúmeras associações e voluntários anónimos que têm tido um papel tão ou mais preponderante que a câmara; em boa parte, são eles que mostram todos os dias aos lisboetas que é possível andar de bicicleta em Lisboa. São o apoio vivo das políticas da bicicleta, aquilo que vai justificando as acções da câmara.


A página da volta também está cheia de supresas. A ver se é este ano que consigo assistir à chegada em esforço ao alto do monte da Nossa Senhora da Graça: é já no dia 4 de Agosto.

 

Outra surpresa é a seguinte e útil imagem (carregar em Ver Imagem para ver maior; se tiver o Internet Explorer, arranje outro):

 

 

 

Porque é que a imagem é importante?

 

Porque numa época em que cada vez mais pessoas andam de bicicleta, torna fácil e pedagógica a lembrança dos termos (palavras) portugueses  para as componentes da bicicleta. O Ricardo Sobral disse-me numa ocasião que uma razão para que a mesma componente tivesse termos diferentes deve-se às mudanças de popularidade que as várias modalidades de bicicleta vão tendo. Um termo de ciclismo de montanha poderia não corresponder ao termo de ciclismo de estrada. Descrever a história do ciclismo em Portugal é também observar a mudança no léxico dos componentes. Uns terão desaparecido, outros vingado. A língua tem camadas e podemos fazer arqueologia com ela. O critério de uso, creio, é sermos criativos e respeitarmos os criadores originais dos vocábulos.

 

Por exemplo, o termo 2; eu uso sempre garfo. Forqueta parece-me derivar do francês, mas posso estar errado. O termo 6: há quem use cassete, mas já ouvi o termo bastante original de pinhão (aqui o termo terá derivado da analogia com uma pinha, digo eu!).

 

O erro no termo 26 é flagrante; crenque é a importação de "crank". Já ouvi roda pedaleira e braço pedaleiro para o objecto. Se ninguém contestar o uso corrente de "crenque" acabamos por perder a oportunidade criativa de criar o nosso próprio termo, até que o seu uso familiar no dia-a-dia pareça tão natural como é hoje dizer-se "turismo" (do francês ou inglês "tour", semelhante ao nosso passeio, veraneio, périplo). Porque se doravante usarmos muitas vezes "crenque" ou "marketing" ou "bike buddy", acabamos por habituarmo-nos à "naturalidade" do seu uso, preterindo o enriquecimento da nossa própria língua. Embora se fale de bicicletas, este assunto é bastante sério, porque diz respeito a qualquer área do conhecimento.

 

Se houver termos com os quais os leitores não concordem, ou dos quais saibam a origem ou a justificação de uso, agradeço informação.

 

É o uso que faz com que as palavras nasçam. Se mais pessoas andarem de bicicleta, muitas mais recorrerão ao seu arranjo e manutenção; logo, a frequência destes termos ficará mais enraizada no vocabulário de todos. O projecto da cicloficina dos Anjos de construir um manual pedagógico de arranjo e manutenção de bicicletas vai nesse sentido.


A ver: um artigo certeiro de Henrique Pereira dos Santos a propósito da crise, das portagens na ponte 25 de Abril e das birras de alguns.