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Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Menos Um Carro

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O trânsito em Lisboa e os guias turísticos

TMC, 06.09.07

É do senso comum que os portugueses ligam muito à opinião dos outros. Talvez daí a expressão para inglês ver. Arrumar tudo à pressa e para debaixo do tapete: à superfície tudo brilha impecavelmente, enquanto que as bases tremem e apodrecem.

 

Segue uma recolha sobre os parágrafos dedicados ao tráfego da capital, presentes nos principais guias turísticos disponíveis no mercado. Palavras para quê? 

 

Guia American Express

 

As pontes de Lisboa

 

Uma das mais famosas referências de Lisboa, a ponte 25 de Abril estabelece a principal ligação entre a cidade, Almada, e a margem sul do Tejo. Construída nos anos 60, quando os carros eram ainda poucos em Portugal, ficou congestionada de trânsito nos finais dos anos 80. Nos anos 90, foram abertas mais vias e construída uma linha de caminho de ferro por baixo para melhorar o trânsito.

 

Como circular em Lisboa

 

Lisboa é uma cidade agradável de explorar. A melhor maneira de o fazer é a pé, mas tem muitas subidas íngremes que fatigarão até o turista em melhor forma física. Os eléctricos e os elevadores são um descanso para o turista fatigado e oferecem excelentes vistas. São uma experiência única, mas podem não ser um meio de transporte eficiente, por isso os autocarros e o metro são uma escolha mais acertada. Conduzir um carro pela cidade não é muito recomendável: a cidade sofre de um engarrafamento quase crónico e o seu plano de ruas é cheio de surpresas inesperadas. Como resultado os condutores são impacientes. Contudo, os táxis oferecem o conforto dos automóveis e são baratos.

 

Como conduzir em Lisboa

 

Não é aconselhável conduzir um automóvel no centro de Lisboa. O tráfego é muito intenso e estacionar o carro pode ser muito difícil, apesar da construção recente de parques subterrâneos. Há muitas ruas de sentido único, o que torna a condução difícil. (...) Se necessitar de conduzir em Lisboa, não perca a calma e evite as horas de ponta, entre as 8h e as 10h e as 17h30 e 20h. Conduzir ao fim de semana é mais fácil. Acima de tudo, tente manter a calma mesmo que o outro condutor se mostrar agressivo. Também é preciso cuidado com os peões, pois as passadeiras estão mal assinaladas e os lisboetas preferem atravessar onde lhes convém.

 

Guia Footprint Lisbon, por Caroline Lascome

 

Car driving in Lisbon and in Portugal for that matter is a hair raising experience. With incessant honking, constant rear-ending, a toxic riot of fumes and unbridled road rage, it’s certainly not for faint hearted.

 

Getting around by car

 

When you have arrived by car, driving in the city is to be avoided. All the main sites are easily accessible on foot or by public transport and attempting to negotiate reckless traffic, precarious construction, complicated one way systems and the slender alleys of the older parts of the city can be horrendous.

 

Tram

 

A helter-skelter ride on one of Lisbon’s ancient emblematic trams is the most enjoyable way to get around Lisbon.

 

Inside Pocket Guide (Discovery Channel)

 

Bus/Tram

 

Lisbon can be packed with traffic, but the buses and trams go everywhere at a surprising speed – except for rush hours – avoid them.

 

Car

 

It’s no pleasure driving around the city (…)

 

Guia Verde Michelin

 

Nesta cidade compacta, de ruas estreitas, a densidade de circulação e a dificuldade de estacionar, fazem com que seja geralmente preferível deslocar-se a pé ou usando os transportes públicos sempre que possível.

 

Lisboa de automóvel

 

O visitante aperceber-se-á que, frequentemente, em Lisboa, o automóvel é mais um fardo que uma ajuda. Durante o dia, o trânsito pode ser caótico e as pequenas ruas dos bairros do centro ficam rapidamente congestionadas. Além disso, encontrar um lugar de estacionamento pode tornar-se um autêntico quebra-cabeças.

Embora os parquímetros não tenham invadido ainda as ruas de Lisboa, terá dificuldade em encontrar um lugar onde pretenda estacionar (...). Dada a excelente rede de transportes públicos e a densidade do centro da cidade, aconselhamos que deixe o carro em casa ou na garagem do hotel. Note-se que, regra geral, apenas os grandes hotéis modernos têm Parques de Estacionamento.

 

Como o futuro hotel do quartel da Graça. Não é Carmona?

 

Spiral Guide Portugal

 

Driving standards are generally poor and Portugal has one of the highest accident rates in Europe.  

Uma espécie de manifesto

TMC, 06.09.07

 

Os manifestos costumavam ser redigidos quando havia algo de tão implacável e indubitavelmente prejudicial à vida das pessoas que a passividade de modo algum podia constituir uma opção. Declamavam-se ideais, prometiam-se amanhãs e uniam-se pessoas e vontades contra uma realidade injusta. Algumas linhas procuravam delinear o que está errado, o que se deve fazer para corrigi-lo e o que se obteria caso as prédicas fossem seguidas. As pessoas identificavam-se com algumas frases e palavras, sentiam-se protegidas por elas e dedicavam-se de corpo e alma aos seus propósitos.

 

Hoje, não há manifestos. Há tédio. Indolência. Apatia, hedonismo. Já não se protesta, aceita-se; quem não concordar com esta tese, sofre de imaturidade. Os manifestos são vistos como perigosos, não tanto por apontarem algo de incoerente, mas porque as suas linhas, afirmam os críticos, se revestem de verdades transitórias, subjectivas e que poderão ser vistas como permanentes e absolutas; ora, tal como mostrou o século passado, tal é verdadeiramente indesejável. As ideias são perigosas. No entanto, se elas surgirem, há maneiras de se evitar um confronto. Primeiro, desconfie-se de qualquer grupo de pessoas que se una por uma causa. Examine-se. Depois, disseque-se. De seguida, desmistificam-se os seus propósitos, classificando-os de absurdos. Não se valoriza a iniciativa, a acção, a mudança; faz-se da crítica uma arte literária, seduzindo a opinião pública com os atávicos valores da ordem e da estabilidade e conservando o actual estado das coisas. E continuamos a queixarmo-nos dessa dor que nos mói, devagarinho, o nosso caro fado português.

 

Sempre vivi em Lisboa e há de ser sempre a minha cidade. Não se escolhe onde se nasce, tal como a família. O que hoje se passa na capital é apenas e só, espúrio. Presenciar a violação contínua do património arquitectónico, do espaço público, das ruas, do rio e das vistas, por gerações de políticos e pelos cidadãos é um convivo diário com o nojo. A cidade não é dos lisboetas, é de uma coisa anónima e omnipresente que a tem vindo a engolir. Derruba, embarga, edifica, constrói, proíbe, cancela, separa, mutila, fere, estropia. A cidade, o seu centro, está a fenecer. O símbolo deste tétrico banquete em que a cidade tem sido servida à modernidade, com pompa e circunstância, é o automóvel. O trânsito é caótico e desnecessário, estacionar a viatura tornou-se numa arte e o património vai sendo preterido para mais estradas, mais acessos viários ou mais parques de estacionamento.

 

Se as principais vantagens de um automóvel são o conforto, a segurança e a rapidez, expliquem-me os seguintes paradoxos: quem se sente confortável numa fila de trânsito, fechado num caixão metalizado? Um hino à liberdade, afirmam uns. Como pode haver liberdade num carro se é necessário obedecer aos semáforos e a demais sinalizações? Se é necessário conviver com o excessivo número de veículos, fumos, stress, buzinas? Quanto à segurança, até Agosto de 2007 morreram mais pessoas nas estradas portuguesas do que as mesmas em 2006. Rapidez? O carro não aproxima pessoas. O uso abusivo do veículo particular tem levado à segregação da população para os subúrbios; ao empobrecimento das ruas; à marginalização dos peões; à qualidade do ar atmosférico; à falta de vitalidade do comércio tradicional. É um nojo e tanto mais por ser tão flagrante. Uma comunicação social incipiente rotula medidas contra os automóveis de ridículas. Andar de bicicleta é um absurdo. Fechar ruas ao trânsito é um atentado à liberdade. Mais quejandos levariam ao vómito e à repulsa honesta.

 

Desencorajar o uso do automóvel enquanto se promovem outras medidas de urbanismo destinadas ao usufruto correcto das ruas, das praças e dos demais espaços públicos não é uma panaceia universal, mas são medidas urgentes para Lisboa. A falta de clarividência nesta matéria dos sucessivos executivos autárquicos, compactuados com alguns comentadores e jornalistas, é tão só e apenas um sintoma. Um sintoma da irracionalidade dos dias de hoje.

Utopia?

MC, 03.09.07
Imagine uma cidade sem automóveis.
Isso mesmo, apenas com transportes públicos e peões.
As praças, as ruas e as avenidas são para as pessoas.
Sem acidentes.
Sem ruído.
Sem stress do trânsito.
Sem pára-arranca nem buzinadelas.
Sem ruas sem carácter e desumanas.
As praças são praças, não são parques de estacionamento.
Com crianças a brincar na rua.
Total liberdade para deambular pelas avenidas e ruelas.
Esplanadas agradáveis em cada esquina.
Ar puro.
As pessoas passeando nas ruas e não nos centros comerciais.
Uma cidade cheia de vida.

Qualquer um dirá que isto é utópico, e que não passa pela cabeça de ninguém. Pois bem, esta cidade existe. E não se encontra num país pobre sem dinheiro para automóveis. Existe num dos países mais desenvolvidos do mundo, tem 250 mil habitantes e tem vida própria. De certeza que a conhece, e provavelmente já lá esteve. Chama-se Veneza.

Nota: Não! Não estou a advogar o fim dos automóveis nas cidades.

Acidentes em Agosto

António C., 03.09.07
Ontem o Público noticiou que os acidentes rodoviários em Agosto tiveram resultados "mais animadores que os de 2006".

Será que, para quem escreveu o artigo, é animador a existência de "apenas" 78 mortos em acidentes, será animador saber que dos 8964 acidentes resultaram 249 feridos graves e 2790 feridos ligeiros.

Ou, observando os dados desde o ínicio do ano em que o valor de mortes na estrada já chega quase aos 500, poderá ser dito que é animador o resultado das campanhas de prevenção e operação das brigadas de trânsito?

Para além do Público, existem outros jornais com secções exclusivamente dedicadas aos acidentes de viação, O Correio da Manha, O Sol, e provavelmente outros. Sim, é um problema da nossa sociedade... mas será que depois de escolhermos o filme que vamos ver no cinema na página 54 vamos ver como foram os acidentes rodoviários na página 23?

A situação é, de facto, preocupante, e animador seria se não houvessem acidentes, ou pelo menos mortes e feridos graves. Ter secções de jornais exclusivamente dedicadas ao assunto, é algo que nos deve fazer pensar, na regularidade com que os mesmos acontecem.

Utilizar a palavra "animador" será, no mínimo, um desrespeito pelas famílias daqueles que perderam a vida, qualquer que tinha sido a razão a levar a tal fatalismo.

Li uma vez, num comentário num blog, um automobilista a acusar, que quem perde alguém num acidente de automóvel, ganha um ódio de estimação a todos que o utilizam. Talvez uma maneira fácil de não nos responsabilizarmos, voltamos a assobiar para o lado e quando vierem novos números encolhemos os ombros de novo.

Eu também sou condutor, e apesar de jovem, também já perdi amigos na estrada. Se calhar isso abriu-me de algum modo os olhos e hoje em dia conduzo melhor e com mais prudência. Pelos vistos, nem toda a gente perdeu alguém e isso continua a acontecer apenas aos outros. Defendem-se abolição de radares, aumentos de limites de velocidade, melhores airbags, e carros mais resistentes, sem nunca por em causa a utilização excessiva que fazemos do automóvel.

Substituir as páginas dos jornais que falam sobre acidentes, por assuntos mais "felizes" não está no nosso horizonte, e como de facto pouco há que nos anime, vamos dizendo como se apenas números se tratassem que este ano foi "mais animador".

"Caça à Multa" à Americana

MC, 02.09.07
Neste país onde o automóvel é rei e senhor, não estamos habituados a que a autoridade do rei seja posta em causa. Qualquer ameaça de fiscalização é sempre tomada como uma afronta. Quando as câmaras começaram a colocar pilaretes nos passeios, houve berraria. Quando a EMEL começou a aplicar o Código da Estrada, berraria. Radares há uns anos no Porto, e agora em Lisboa, berraria.
Obviamente que nunca houve contestação quando as leis foram aprovadas, porque sempre se partiu do princípio que o carro estaria sempre impune. Só quando cheira a aplicação das leis, é que temos "aqui d'el rei"!

À conversa com amigos a trabalhar nos EUA, pátria da carro-dependência, fiquei a conhecer alguns casos, que ao aconterem em Portugal seriam o fim do mundo.
- Multas de estacionamento passadas de madrugada cinco minutos após o prazo.
- Os lugares para estacionar com a indicação "máximo de 2 horas", são mesmo só para duas horas. Um fiscal vai fazendo a ronda marcando os pneus com giz, para contabilizar o tempo.
- A EMEL lá do sítio não tem pachorrentos funcionários, que ora conversam, ora vão andando. Os fiscais vão de carrinho na faixa direita e munidos de um espelho/periscópio vão rapidamente controlando os parquímetros. E a multa não demora horas a ser passada, é passada em segundos.

Que me dera...

Acalmia no Trânsito II

MC, 01.09.07
Outra maneira bem simples e baratíssima (além das lombas sinusoidais) de baixar a velocidade média dos automóveis nas ruas secundárias da cidade, é obrigar o trânsito a fazer uns zig-zagues. Nem é necessário pôr canteiros ou reconstruir os passeios como na foto, basta pintar os lugares de estacionamento dum lado da estrada rua durante 100 metros, e depois do outro lado, etc...
As crianças a brincar na rua, os peões e os habitantes agradecem (ou melhor agradeceriam se houvesse o mínimo de vontade política).

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