A indústria automóvel não brinca em serviço
A coisa andava aí a pairar, e hoje somos brindados com dois favorzecos das nossas autoridades para a indústria automóvel.
1. No meio de uma crise internacional - onde todos os sectores estão a passar por dificuldades - a indústria consegue mexer os cordelinhos nas altas esferas do poder, conseguindo milhões de ajuda para se safar da crise. O governo português (que não está só nesta questão) avança com um apoio de 900 000 000* de euros para a indústria, o equivalente a 5 ou 6 vezes o custo de um novo hospitaldistrital! Outra comparação, baixar o IVA de 21% para 20% custou apenas 600 milhões.
Se há razões económicas especiais para os governos apoiarem o sector bancário em tempos de crise (onde é fundamental que haja crédito e liquidez disponíveis) - e note-se que estes valores não se aproximam nem de perto nem de longe ao dinheiro gasto no apoio à banca - não há absolutamente razão nenhuma para apoiar a indústrta automóvel em detrimentos de outros sectores. Aliás, apoiar uma indústria que está na base de vários problemas mundiais actuais (crise energética, aquecimento global, guerras), parece-me um absurdo. A única razão que encontro para esta ajuda, é aquilo a em economia se designa tecnicamente por uma "ganda cunha".
P.S. Ainda bem que o Ministro Pinho afirma que a crise no sector automóvel português não é tão grave como no resto da Europa. Nem quero imaginar o que o governo teria feito se fosse da mesma gravidade... (obrigado Tiago)
*Com notícias que vieram entretanto a público, ficou-se a perceber que parte deste montante, mais exactamente 200 milhões, fazem parte de uma linha de crédito - logo não são "dados" à indústria. Apenas emprestados em condições especiais. É importante sublinhar a diferença, porque no caso da banca houve muito sensacionalismo na imprensa para empolar os gastos públicos.
2. Claro que dinheiro não chega. Os governos da UE voltaram a afrouxar as exigências ambientais à indústria automóvel. O limite dos 130g/km de CO2 que deveria ser cumprido em 2012, foi novamente chutado para 2015. Para enquadrar bem a questão, noto três coisas:
- a mesma indústria convenceu em 1998 as autoridades europeias que não seria necessária qualquer regulação ambiental, tendo-se na altura comprometido a baixar as emissões para 140g/km em 2008. O valor médio em 2005 era contudo de 159g/km! Como diz a BUND, organização ambientalista alemã, o "cumprido não é devido".
- em 2006 esteve para ser aprovada legislação a obrigar a indústria aos 120g/km em 2012, mas os cordelinhos de última hora conseguiram facilitar a coisa para os 130.
- esta semana, a Agência Ambiental Europeia veio dizer que a Europa não vai cumprir os limites estabelecidos na directiva de limites de emissões (estamos a falar de 4 poluentes diferentes!) devido... ao transporte rodoviário!
Uma boa notícia em Lisboa para compensar, o programa de bicicletas públicas/partilhadas que tinha sido chumbado pela maioria PSD na AML, foi hoje aprovada em reunião de vereadores - depois de algumas alterações ao seu financiamento.