Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Menos Um Carro

Blog da Mobilidade Sustentável. Pelo ambiente, pelas cidades, pelas pessoas

Caça à multa ou ao disparate? III

MC, 06.02.15

Acho que posso dar como dado adquirido que há mais aceleras cá, do que na Holanda, por exemplo. Assim, se as polícias dos dois países controlassem o mesmo número de automobilistas, a portuguesa iria certamente apanhar mais infrações.
Mas se o número de infrações fosse semelhante, teríamos de concluir que a polícia portuguesa é mais branda que a holandesa.

E se vos disser que não é semelhante, nem sequer é ligeiramente menor por cá, mas é 50 vezes menor apesar de ser ridiculamente fácil avistar um acelera em Portugal? Teríamos de concluir que a nossa polícia é, no mínimo, conivente com o excesso de velocidade. A verdade é que, de acordo com o relatório da ETSC (European Transport Safety Council), Portugal está em último lugar na Europa, em termos de número de aceleras multados por cada 1000 habitantes.

Screenshot from 2015-02-06 17:35:43.pngSim, o relatório já tem uns anos, mas infelizmente é o mais recente e estes números são difíceis de encontrar para todos os países para anos mais recentes. Mas desengane-se quem achar que muita coisa mudou desde então.  Tem havido de facto um aumento, mas muito tímido face a disparidade expressa acima. A semana passada saíram os dados de 2014. Subimos para as 25 multas por excesso de velocidade por mil habitantes.  Vergonhosamente pouco.

Enquanto as nossas cidades e estradas continuam a ser o faroeste rodoviário, a imprensa e o "senso-comum" continuam convencidos que há uma caça à multa...

(obrigado Miguel)

Outras postas relacionadas:

Caça à multa ou ao disparate?

Caça à multa ou ao disparate? II (valor das multas cobradas é Madrid é mais do que Portugal inteiro)

O excesso de velocidade de uns, e a fiscalização ao incumprimento dos outros

MC, 24.10.14

Já todos sabíamos mas não havia muitos números que o provassem: ninguém leva a sério os limites de velocidade legais em Portugal. O Público conta-nos contudo de um estudo da Prevenção Rodoviária Portuguesa, que não deixa margens para dúvidas:

 

  • "na Avenida da República [Lisboa], a velocidade aumentou de 44 para 55 km/h e agora seis em cada dez automóveis circula acima do máximo legal"
  • "No Porto, a avenida Fernando Magalhães continua com 71% de veículos em excesso de velocidade"
  • "na A2, para o Algarve, [a média dos carros ligeiros] chega a 128 km/h. Quase dois terços dos condutores ultrapassa os limites."

Se estes números não fossem por si só chocantes, é importante lembrar que eles são medidos num dado instante. Sendo que até o campeão dos aceleras circulará dentros dos limites a certa altura do percurso, o inverso também se aplica: os poucos que naquele dado instante cumpriam a lei, muito provavelmente não a cumprirão um quilómetro à frente. Será por isso seguro afirmar que, ao longo das vias referidas, o número de automobilistas que ultrapassam a velocidade máxima estará mais perto dos 80% ou 90%. 

Isto atira mais achas para a fogueira para a discussão de quem desrespeita mais o código e causa mais perigo, se automobilistas, peões, etc. Mas toda esta conversa fica totalmente inquinada quando se quer comparar directamente actos de pessoas dentro de uma caixa metálica de 1,5 toneladas, com pessoas a pé, ou em cima de bicicletas de 15kg.

Vejamos, o serviço de prestar refeições em restaurantes ou cantinas, é altamente regulamentado. E bem. Há vários padrões de higiene a ser cumpridos por estar em causa a saúde dos outros. Se eu usar ovos estragados no meu restaurante, posso estar a atirar alguém para o hospital, devendo por isso ser condenado. Por outro lado, não há qualquer legislação sobre a higiene que devo ter em casa. O bom-senso é suficiente para eu não querer pôr em perigo a minha saúde e da minha família.

O respeito pelo código da estradas é muito semelhante à história dos ovos estragados. Os "descuidos" de um automobilista põe acima de tudo a integridade física dos outros em perigo, enquanto a única vítima do descuido de um peão/ciclista é principalmente ele próprio. Defender que haja mais controlo dos peões/ciclistas, é quase como defender que haja legislação para os ovos que eu uso em casa e que a ASAE deve controlar a minha cozinha. Claro que em alguns dos casos há outras vítimas (tal como pode haver um vizinho que possa provar às escondidas a comida estragada). E obviamente que se tratando de um espaço público, onde os fluxos se cruzam, o comportamento de cada um deve ser regulado. Contudo, no que toca à relevância da negligência de uns e outros para o bem comum, a situação é semelhante.

 

Para concluir, mais um números números elucidativos sobre o respeito dos automobilistas pelo código.

  • "num milhão de condutores são 25 mil a falar no telemóvel, só naquele momento"
  • "quatro em cada dez automobilistas (39%) não pararam no semáforo nos três segundos depois de passar a vermelho.

Boa notícia: 4 milhões para radares

MC, 17.11.11

Finalmente uma boa notícia vinda deste governo, um investimento de 4 milhões de euros em novos radares de controlo de velocidade.

Quando Portugal tem das maiores taxas de incumprimento do código da estrada na Europa, quando temos dos números mais baixos em termos de multas passadas, quando o Estado tem penalizado quem trabalha e quem produz - através dos impostos sobre o consumo e os rendimentos - porque não penalizar os comportamentos ilegais? Não percebo porque pode chocar  que o Estado triplique ou "ventuplique" as suas receitas em termos de multas, em vez de o fazer através do IVA e do IRS.

Será importante assegurar que as multas não sejam só passadas, mas também cobradas. Para tal bastaria que houvesse cruzamento de dados com outras cobranças e pagamentos do Estado. Tal como um clube de futebol não pode participar num campeonato se tiver dívidas em atraso, poder-se-ia reter a devolução do IRS/IVA a automobilistas com multas em atraso por exemplo.

 

 

............................................................................................

Para algo totalmente diferente, um apelo da Cicloficina semanal dos Anjos (Lisboa):

 

Schritttempo: máxima de 7km/h no centro

MC, 20.09.11

Enquanto entre nós ainda haja quem discuta o limite de velocidade de 50km/h dentro das cidades, e ainda se toleram velocidades de 80km/h mesmo em ruas densamente povoadoas, o Schritttempo (velocidade do peão) ganha adeptos na Alemanha. Em Schwetzingen, a zona história tem agora um limite de velocidade global de 7km/h, como nos conta o Tagesschau. O vídeo está em alemão, mas mesmo para quem não percebe, vale a pena vê-lo.

 

P.S. A ideia principal, mais do que impôr os 7km/h, é afastar o trânsito da zona central mas sem o proibir. Só quem mesmo precisa de passar por uma zona de 7km/h é que o fará.

 

..........................................................................

E como estamos na semana da mobilidade, a CM de Lisboa e a FPCUB convidam todos os Lisboetas a irem de bicicleta para o trabalho/escola esta quinta-feira, dia 22 (ex-"dia sem carros"). Sim, não vai mudar o mundo. E sim, é meramente simbólico. Mas é o dia ideal para convencer que está quase convencido, e tentar a primeira vez!

Encontrado por aí (II)

TMC, 04.04.11

A Avenida Infante Dom Henrique é uma das várias auto-estradas urbanas existentes em Lisboa. Paralela à margem direita do rio Tejo, é pouco sinuosa, quase sempre plana e com uma largura para vários automóveis. O resultado: uma emulação de uma pista de corridas para o piloto de F1 frustrado que possa haver em cada condutor. Mesmo com a instalação de semáforos, e nestas condiçõs, cada bólide parece ter como objectivo ultrapassar o amarelo antes deste tornar-se vermelho...e com isso alcançar uma fugaz glória.

 

 

Um abraço ao autor.

 

 

 

 


Um grande e especial muito obrigado aos leitores que, no âmbito dos "Green Bloggers Awards" de Fevereiro, votaram no texto "O comércio e a rua". Sem o vosso apoio não nos esforçaríamos por estar em permanente actualização e aprendizagem acerca dos temas que aqui abordamos. E claro, não teríamos sido vencedores desse mesmo prémio. Continuem connosco, por cá estaremos.

Caça à multa ou ao disparate?

MC, 30.09.10

Hoje soube que na Holanda foram passadas 25 mil multas por excesso velocidade perto de obras, num trimestre apenas. Excesso de velocidade junto a obras? Claro que em Portugal há alteração dos limites de velocidade quando há obras, mas isso alguma vez é controlado? Isto fez-me pensar na afamada "caça à multa" que alegadamente se pratica em Portugal e fui procurar alguns dados:

Em Portugal foram passadas 162 mil multas por excesso de velocidade em 2007, ou seja 14,3 por cada mil habitantes.

Mas na Inglaterra e País de Gales houve em 2005 35,2 multas por cada 1000 habitantes. Na Alemanha, onde nem há limite de velocidade em muitas auto-estradas, este número foi em 2008 de 62,8 multas. Na Bélgica, 64. Nos EUA, são 132. Na Holanda, 550. Só na primeira metade deste ano, houve 240 mil multas no Tirol, 685 multas por mil habitantes ao ano.

Esta chocante passividade para com o comportamento criminoso dos automobilistas tem ainda duas agravantes. Primeiro, em Portugal são poucas as multas que são realmente cobradas. Segundo, é muito mais fácil descobrir um carro em excesso de velocidade por cá, ou seja, com o mesmo nível de intensidade e de tolerância de controlo até seria de esperar que a polícia portuguesa passasse mais multas. Acontecendo o contrário percebe-se o quão mais tolerante são as nossas autoridades.

 

 


A ler no EUobserver: EU, US biofuels rules aggravating third world land grab, World Bank says

A velocidade causa acidentes, ponto final

MC, 02.09.10

Há sempre algum wishful thinking quando se levanta o tema do controlo de velocidade como método de redução de sinistralidade.  Gosto particularmente  do argumento que sustenta que velocidades baixas causam sonolência, logo causam acidentes. Não se riam porque não o ouvi numa tasca, mas de alguém que aparece frequentemente nos media a falar sobre sinistralidade (apesar de não estar ligado ao tema).

Como eu gosto de basear os meus argumentos em estudos científicos, aqui ficam algumas conclusões dos dois primeiros estudos que apanhei numa base de dados académica (não andei à pesca de números sonantes).

 

Do estudo "The effects of drivers’ speed on the frequency of road accidents" do Road Safety Division, Department of the Environment, Transport and the Regions:

 

- Reducing the speed of the fastest drivers (...) is likely to bring greater accident benefits than reducing the overall average speeds for all drivers, particularly on urban roads.

- The percentage reduction in accident frequency per 1mile/h reduction in mean speed has been shown to vary according to the road type and the average traffic speed. It is:
about 6% for urban roads with low average speeds;
about 4% for medium speed urban roads and lower speed rural main roads;
about 3% for the higher speed urban roads and rural main roads.

Traduzindo para as nossas unidades, a simples redução de 1km/h na velocidade média, reduz os acidentes em 3%.

- A reduction in average speeds (averaged across the whole network) of just 2miles/h [3km/h]. This would mean that each year more than 200 deaths and about 3,500 serious casualties would be prevented [valores para o Reino Unido].

 

Do estudo "Driving speed and the risk of road crashes: A review" do Institute for Road Safety Research da Holanda:

 

- None of these relatively recent studies found evidence that also vehicles that move (much) slower than the surrounding traffic have an increased crash rate.

- 1% increase in speed results approximately in 2% change in injury crash rate, 3% change in severe crash rate, and 4% change in fatal crash rate.

 



O mundo das bicicletas não pára! Depois do Bicycle Film Festival em Lisboa no início de Outubro, teremos o Bicycle Music Festival a 15 e 16 de Outubro em Lisboa, e 31 e 31 no Porto!

Radares

TMC, 20.04.10

 

Quando surgiram, os radares foram apelidados de, e cito de memória, um “atentado aos direitos dos condutores”, uma “caça à multa” e outros protestos quejandos, vindos de um grupo de pessoas que, não sendo automobilista profissional, pretendia fazer finca-pé dessa regalia de usar algumas ruas de Lisboa e Porto como pistas para os bólides. Uns protestaram porque achavam tudo muito natural, outros, mais temerários, até se atreveram a falar em ganhos ou perdas de tempo e até de produtividade. Enfim. Compreende-se este alarido. Para o curioso, não deixa de ser extremamente irónico haver um grupo de pessoas dispostas a perder tempo a defender os direitos dos automóveis. Mas não é assim tão simples.

 

Os resultados até são indesmentivelmente positivos. O efeito psicológico do número 50, envolto numa auréola vermelha lembra esse limite que, no velocímetro, está logo no princípio da escala. 50km/h. É esse, afinal, o limite previsto pelo código da estrada e que tem razão de ser: a partir dessa velocidade, um impacto entre peões e automóveis é quase uma garantia de morte certa para um deles e de pena suspensa ou ilibação para o outro. Há, assim, uma prevenção de segurança por precaução das velocidades praticadas; e os próprios números de sinistralidade, segundo a Polícia Municipal, têm diminuído.

 

Não deixa de parecer absurdo, porém, ao automobilista comum, que o seu bólide, marcando velocidades até, pelo menos, os 120km/h (o limite nas auto-estradas) tenha que se restringir a essa mísera meta de 50km/h nas cidades. Uma miséria. Não se compreende. Se o código da estrada apresenta limites de 50km/h para as localidades e de 120km/h para as auto-estradas – o percurso comum do automobilista comum que reside num subúrbio – porque teriam as empresas construtoras de automóveis construído motores que permitem ultrapassar esses limites sem dificuldades? Porque somos constantemente bombardeados com a potencial rapidez e robustez dos automóveis, escarrapachada de forma quase pornográfica em anúncios de rádio, televisão e revistas?

 

 

Estremunhado, na cama, é frequente ouvir da rádio um anúncio da Autoridade para a Segurança Rodoviária com gritos e música melancólica, logo seguido de outro apelando o leitor a comprar um carro e das respectivas características.

 

Mas os absurdos não acabam aqui e, para mim, nem são sequer os mais graves. Não sei qual dos fenómenos foi responsável pelo outro; desconfio até que sejam mutuamente originantes. Basta olhar para as estradas em que foram colocados os radares. São largas, desérticas, de pelo menos duas faixas em cada sentido, sem edificado e algumas até têm um ou outro peão, que se aventura num ambiente que não é o seu. São autênticas auto-estradas urbanas que rasgam a cidade. Perante este tipo de estrutura, como não acelerar para além de 50km/h?

 

 

Foram os urbanistas que também permitiram, através da forma dada à cidade, que os condutores tenham essa prática espontânea de acelerarem acima do limite legal. As estradas com radares são hoje elementos estranhos ao seu tecido e que foram construídas com o propósito de satisfazer os paradigmas de velocidade e poupança de tempo. Paradigmas falsos.

 

Medidas avulsas como os radares são bem-vindas mas devemos recordar-nos que são remendos possíveis no erro crasso de origem. Como alguém que tendo começado a construir a casa em areias movediças acha que tem de mudar a cor das paredes.

Quem é mais rápido, o carro ou a bicicleta?

MC, 08.01.10

Ninguém põe em causa que o carro seja mais rápido que a bicicleta numa recta desimpedida, mas também nunca houve na história alguma viagem que tenha começado com um salto da porta de casa para dentro de um automóvel em rápido andamento e tenha acabado com um salto em andamaneto para a porta do destino, e sem qualquer abrandamento pelo meio.

Quem anda de carro gosta de esquecer que uma viagem na cidade não se resume aos troços desimpedidos entre dois semáforos. Eu gosto sempre de lembrar os automobilistas que eu tenho sempre lugar à porta! Na realidade uma viagem é composta por:

 

 

Vantagem

do Carro

Vantagem

da Bicicleta

Da porta de casa até ao veículo
Desde a chegada até ao arranque
Aceleração (em qualquer arranque)
Deslocação com pouco trânsito
Deslocação com muito trânsito

Obstáculos (carros a estacionar,

carros mal estacionados, etc.)

Aproximação ao semáforo1
Espera no semáforo2
Arranque no semáforo3
Procura de lugar para estacionar
Estacionamento
Deslocação do estacionamento até ao destino
Percurso escolhido4

 

1. O carro fica atrás de todos os carros que já lá estão. A bicicleta passa pela fila até ao início.

2. Nem me refiro a quem passa alguns vermelho (como eu), mas à possibilidade legal de se passar o semáforo a pé pelo passeio (para virar à direita por exemplo).

3. A bicicleta arranca sempre em primeiro e é mais rápida, o carro por vezes nem passa o primeiro verde.

4. A bicicleta não tem mudanças de direcção proibidas, pode-se sempre virar à esquerda por exemplo, saindo da bicicleta e atravessando como peão. Contudo o declive pode levar um ciclista a escolher um percurso maior.

 

Por estas e por outras é que a Comissão Europeia afirma no seu famoso e interessantíssimo documento de promoção da bicicleta, que a bicicleta é em média mais rápida que o carro até deslocações de 5km.

 


Um leitor deixa-nos a sugestão do World Commute, uma espécie de rede social para quem se desloca pela sua própria força motriz (a pé, de bicicleta, etc.) com ferramentas para registar e compartilhar percursos e experiências.

Auto-estradas Urbanas

TMC, 07.12.09

Uma das consequências mais danosas da implementação maciça do automóvel nas cidades foi a reorientação do planeamento das estruturas de acordo com a sua lógica; uma reorientação que sacrificou muitos dos outros elementos da cidade, nomeadamente o peão e o espaço público.

 

Toda a potencialidade que um determinado terreno tem para assumir uma função, seja um jardim, um parque, um bairro habitacional, comércio, escolas, etc é reduzida apenas a uma função quando se constrói. Voltar atrás é muito difícil porque na cidade não se apaga uma estrutura como se apaga uma assinatura. Mas enquanto se assumir que é legítimo obedecer à necessidade voraz de espaço do automóvel, não questionamos que a potencialidade de um espaço seja frequentemente redireccionada para novas estradas.

 

O ciclo perpetua-se da seguinte maneira: 1) criam-se vias para os automóveis poderem circular 2) facilita-se a aquisição e a guarita do automóvel, através de fiscalização inadequada e de estacionamento quase gratuito 3) numa certa escala de tempo as vias entopem e não escoam 3) obedece-se à procura, mantendo-se a ilusão que automóvel éé sempre sinónimo de ganho de tempo através da velocidade e, voilá, 1) outra vez

 

Já o quase esquecimento do peão é, quanto a mim, muito mais misterioso porque é a forma mais básica de locomoção do ser humano. Andar a pé é inevitável e embora alguns sonhos do urbanismo moderno imaginassem a vida no futuro equivalendo a cidade a um gigantesco drive-in, a medida da negligência do peão nas nossas estruturas só demonstra o quão infecciosa é hoje a presença do automóvel na cabeça dos que planeiam as cidades.

 

Esta negligência do andar a pé está hoje presente nas ditas auto-estradas urbanas: estruturas híbridas e monstruosas que rasgam o tecido urbano, já de si caótico; não são estradas nem avenidas, são apenas um erro crasso de planeamento e a vontade de continuar o paradigma da velocidade: se há congestionamento, criem-se mais acessos, para lá de tudo o que existe e servindo apenas e só o automóvel. 

 

Um exemplo, tirado do blogue Discovering Urbanism e que é delicioso porque mostra precisamente a tal inevitabilidade do andar a pé. A cidade é Brasília, o planeamento é muito moderno mas, teimosamente, lá surge o peão, esse rebelde e que teima em caminhar e criar os seus próprios trilhos, para lá daqueles delineados para o automóvel. A ilusão da velocidade promove o esquecimento do corpo mas é impossível desligarmo-nos dele.

 

 

 

Um peão que circule ao lado das velocidades permitidas aos automóveis nas vias principais não tem uma percepção favorável da sua segurança nem as condições necessárias para andar. Mesmo que seja esse o melhor caminho entre dois pontos e para as suas escolhas de locomoção (o automóvel não é universal).

 

 


Qual é a maneira mais simples  e elegante de criar, simultaneamente, barreiras anti-ruído, ar mais saudável, clima de proximidade e ainda desacelaração de tráfego? Será um sistema inteligente em tempo real geo-referenciado ou qualquer outra parafernália tecnológica? Árvores. Muitas. Uma distância não são dois pontos, é também o preenchimento dos intervalos.